detalhe de desenho de Anucha

(de esporadicidade imprevisível)

Da morte

05/04/19

De repente morre alguém mais próximo e, às vezes, alguém próximo demais. Quase sempre essas mortes nos atingem com um golpe profundo, escancarando toda nossa incompreensão sobre o fim. Fim que, sabemos, encontraremos pessoal e inexoravelmente, mais cedo ou mais tarde. Provavelmente os outros bichos não "sabem" que morrerão, mas nem disso podemos estar certos, assim como não sabemos com clareza o que seja "saber".

Não esqueço uma cena de documentário, da savana africana, onde uma zebra fica para trás e, quando o bando segue adiante nas ondas migratórias, ela permanece ao pé do cadáver de sua cria. O filme não diz a causa mortis, mas ela me parecia perplexa diante da morte. O bando foi-se e ela ficou, talvez a esperar que algo "acordasse" seu rebento.

Como ela, ficamos sem saber o que dizer, inseguros com nosso pensamento, com o sentir e preocupados com aparências, com o que "esperam" de nossa reação etc.. A mente tenta conduzir uma situação que transcende a razão. Somos complexos demais para o racional e emoções e memórias, pessoais e coletivas, atonam em momentos contundentes. O afloramento inesperado nos desnorteia.

A morte vem como o ponto final de um livro que nos entreteve, divertiu ou com o qual convivemos, mas com os livros existe sempre a possibilidade do da capo e é possível relê-lo eternamente. Com a vida, não.

Tudo isto não passa, no fundo, de falatório desconexo de uma mente sem saber como lidar com o término de uma vida mais próxima, com a inevitável outra face do viver. A morte abre feridas que só o tempo poderá fazer tudo voltar ao normal. O tempo tem sua própria ação por diferentes vias.

Por fim, voltam-me à lembrança alguns amigos, que foram muito além da amizade quando vivi momentos bem difíceis com a morte de pessoa muito próxima. A eles sou eternamente grato.

Fri, 5 Apr 2019 18:50:49 -0300

Clode querido

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Beijo, sobrinha queridíssima.


Fri, 5 Apr 2019 19:12:37 -0300

Querido Clode <3
Um beijo sempre cheio de carinho e saudades.

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Obrigado.


Fri, 05 Apr 2019 19:19:24 -0300

Emocionante, Clode.
Por falar em morte, né?, no dia de hoje...

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Não estamos preparados para a morte...


Tue, 9 Apr 2019 22:22:29 -0300

É da idade. Também ando me enrolando com a finitude. Sou um cronista bissexto, sem a tua verve e estilo, mas as vezes não resisto:

"Deveríamos começar ensinando as crianças que o Universo vai acabar daqui a 5 bilhões de anos, que o Sol vai durar mais ou menos a mesma coisa e que nosso planeta - devido ao aumento da luminosidade do Sol, a perda de energia térmica pelo núcleo, as pertubações provocadas por outros corpos do Sistema Solar e as alterações bioquímicas na superfície, acabará bem antes da nossa estrela. Dizer que a nossa espécie; Homo Sapiens vai se extinguir logo mais, que viveram muito mais espécies no planeta do que as que hoje existem, que nada nesse universo tem um propósito ou intenção, que a evolução é cega e que não há necessidade da existência de um criador para justificar tudo o que existe a nossa volta.
Com esse quadro realista na base, a educação se desenvolveria livre de superstições, crenças irracionais e medos injustificados, e os indivíduos encontrariam seus limites naturalmente. Muito duro? Melhor do que inculcar nas cabecinhas toda essa lenga lenga parva criacionista. "Ah, mas é muito duro para as criancinhas. Elas precisam ter ilusões..." Então deixem que elas criem suas próprias ilusões. Certamente terão mais qualidade poética do que as que por lá circulam atualmente."

Grande abraço do teu amigo e leitor assíduo.

Ebert

Oi, Ebert.

Sim, a idade nos faz mais presente o próprio fim e não sabemos lidar com a finitude.

Gostei muito do seu texto e roubei uma frase para a crônica de amanhã. O perigo, me parece, é que tudo que tocamos pode, facilmente, se tornar doutrina...

Como ensinar às crianças a pensarem por si? Não é fácil.


Tue, 16 Apr 2019 08:50:31 -0300

Querido Clode,
Bom dia!
Tenho vindo pouco aqui nesta caixa postal e, quando venho, é para ler suas crônicas.
A vida no trabalho, sempre corrida, faz com que deixemos de fazer muitas coisas importantes - uma delas é ler crônicas com maior frequência.
Lembrei do seu aniverário, dia 7 de março, junto com meu amado irmão - não lhe escrevi.
Lendo, hoje, suas reflexões sobre a morte, penso nas pessoas que se foram recentemente... seu texto me ajudou.
Anteontem foi a vez de minha querida amiga Ângela, aquela que fui visitar no Rio, em 2016.
Entender e "aceitar" (não sei se é a palavra que eu queria, mas, não encontrei outra) conceito da impermanência é crucial.
Um grande abraço, saudade.

Oi, Rô, boa tarde.

Conheci a Ângela naquela sua vinda, ou estou enganado? Pois é, na medida que envelhecemos somam-se as mortes de amigos. Foram elas que me levaram a esta crônica.

É muito difícil relacionar-se com a impermanência e com a consciência do próprio fim.

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