crônica do dia

Desaniversário

08/03/02

Um disquinho de plástico transparente e colorido resumia, cheio de músicas, "Alice no País das Maravilhas". Naquele tempo ainda não existiam, os compactos. Os discos eram analógicos, para tocar com agulha e por causa de um simples arranhão podiam repetir três ou quatro sílabas indefinidamente.

Entre as adaptações da história, existia uma canção de desaniversário. Por muito tempo soube repetir suas palavras com um arremedo da melodia - sina de desafinado.

Não lembro se o disco era fiel a Lewis Carroll, mas a idéia é simples: no País das Maravilhas não se comemora aniversário, muito aborrecido, por acontecer num único dia do ano, que custa tanto a chegar e logo acaba. Festeja-se, isso sim, o desaniversário, em todos os outros dias... menos no do aniversário, é claro. Eis aí, por trás da brincadeira, a lição.

Dia das mães, dos pais, das crianças, do isso e do aquilo. Hoje é o da Mulher. Dia de pôr a Mulher em pauta, literalmente. Produzir matérias jornalísticas sobre a Mulher, mesmo que não se saiba muito bem o que ela seja, em sua essência. Pesquisar um pouco o que já se falou e escreveu sobre a Mulher e peneirar, como garimpeiro, o que parecer mais brilhante. Entrevistar algumas mulheres em evidência com as perguntas de que for capaz etc. É como se fosse o dia do aniversário da Mulher.

Aprendo no rádio que, a origem da comemoração remete à Mulher operária pois, num oito de março, em Nova York, queimaram cento e tantas mulheres trancafiadas numa fábrica, apenas porque estavam em greve por melhores condições de trabalho e melhor salário. Todas morreram.

Amanhã já não será mais dia da Mulher. Elas sairão das pautas e voltarão a ser apenas mulheres, mães, esposas, faxineiras, cozinheiras, namoradas... Amanhã e todos os outros dias do ano, será o dia do desaniversário da Mulher.

Feliz desaniversário para você!

 

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