Do outro Mundo

 

Dividimos o mundo em vários mundos mas, se olharmos bem, é um mundo só. Falamos do mundo dos negócios, do trabalho e das diversões. Pomos em outra gaveta o que chamamos de mundo religioso. Criamos novas hierarquias com o mundo das crianças, dos adolescentes, masculino e o feminino. Há mundo disso e daquilo - são milhares!

E no entanto, se olharmos bem, no fundo, é um mundo só. O mundo dos homens, dos bichos, das plantas, dos vírus e todas essas formas no limiar da vida. É o mundo surpreendente, aglomerado nesta película que envolve o planeta e operou o milagre da vida, um mundo belo e feio. Sujo e cristalino. Cheio de violência e onde brotou o mistério do amor.

Do mesmo modo que fragmentamos o mundo, o fazemos com nossas vidas. Somos fragmentados porque não temos tido sucesso na busca da unidade, em nós. Somos ora mãe, ora filha, ora esposa, ora patroa, ora empregada, ora pura, ora devassa - e tudo se repete se trocarmos o gênero, pai, filho etc. Sem a pieguice do politicamente correto, mas simplesmente porque qualquer um pode ser ora pai, ora mãe, ora bolas!

Ora, ora, dona Sabrina, a senhora andava sumida! E digo mais, sua pergunta é boa: por que me meto a falar dessas coisas? Porque tive o ímpeto de contar do meu espanto ao tomar contato com um mundo que não me era familiar. O ímpeto de sentar-me na aparentemente confortável cadeira do crítico e deitar falatório como alguém fora e inatingível. Mas tenho percebido, dona Sabrina, nesses últimos tempos, que somos mesmo um pedaço da humanidade, de fato e que, dela, tudo se reflete em nós. Basta procurar com atenção e perceberemos aquilo que mais nos horroriza vicejando em algum canto de nós, como erva daninha. Já notou, dona Sabrina?

A capa de um dos últimos números da revista Exame afirma que os negócios tradicionais estão em risco devido ao "crescimento explosivo da venda de produtos e serviços pela Internet". Por isso, comprei uma publicação que jamais leio. Depois, por estar à mão, li outras matérias, todas supostamente dirigidas a executivos e outros profissionais do mundo do negócios. Daí veio meu espanto inicial e o título para estas linhas.

Os outros negociantes, são tratados como rivais e a tentativa de conseguir vender mais, como uma guerra. Fala-se de estratégia e espionagem, embora sempre com eufemismos e metáforas. Os espiões, por exemplo, são os profissionais de Inteligência Competitiva e para deixar claro que não se trata de espionagem, logo de cara se afirma: "Quase toda informação de que você precisa pode ser obtida de forma totalmente gratuita, totalmente legal, totalmente ética." O grifo é meu.

Fico só neste exemplo, por acreditar que se olharmos bem para dentro de nós, neste caso ou em qualquer outro, sempre veremos ervas do mesmo tipo em algum canto de nosso jardim...

 

Publicada sexta-feira, 25 de junho de 1999

 

 

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