detalhe de foto de  1966Crônica do dia

No fim, cada mania acha seu louco.

Estranha manhã

11/04/08

Estranha manhã de sexta-feira! Nela, tudo parece espreitar. Nenhum pio, nenhum movimento do ar. Muito cedo se evaporaram as nuvens que toldavam o azul e o sol se fez pela primeira vez neste outono como luz outonal. Mas a umidade satura este canto perdido do mundo penetrando e empapando toda natureza. As gotas das chuvas de ontem luzem ainda sobre as folhas. A roupa na corda não conseguiu secar.

A vida luta para sobreviver. Movimenta-se a folhagem e o sopro é frio. Cigarras celebram em cantos os últimos dias de um verão que a meteorologia prevê para hoje e amanhã, talvez domingo também, antes da chegada do primeiro frio grande, na esteira das chuvas prometidas para segunda-feira. Ao canto da cigarra seguem-se pios e o zumbido de uma multidão de grilos. Faz-se sonora a natureza, como se ao toque de um interruptor.

O céu continua baço por alguma água ou poluição. As folhas se secam e contribuem, ao sol, para uma eventual tempestade, mais tarde. Por um instante, parece que todos os seres são grilos em um chamamento alucinado. Abundam flores, caem folhas e pétalas, entrelaçam-se trepadeiras e mil galhos nus riscam o azul, a confirmar nossa condição tropical.

A sensação de espera, de algo iminente, a primeira impressão de um espreitar desapareceu. Um grande grilo ou gafanhoto pula de uma folha à outra. Também pássaros passam de galho em galho. A pequena borboleta preta, amarela e vermelha simula um broche num seio verde.

A evaporação deve ser, agora, formidável - o céu branqueja a olhos vistos e a luz se torna tênue. Delimitam-se azuis e brancos, nuvens começam a tomar forma. Tudo trama um temporal mas, por enquanto, a manhã oscila em seu jeito de ser estranha se fazendo de verão. Um cachorro late, longe. Outros lhe fazem coro. Nos azuis, o sol pincela e delineia forte, como promessa da luz de maio.

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