Crônica do dia

 

Miniatura

15/04/05

 

De repente chamou-me atenção o comportamento incomum de um pardal, mas... pardais não são zebrados e aquele era, no peito e na testa. Listras horizontais em dois tons de cinza, um bem claro e outro bem escuro. Era um pica-pau em miniatura, exceto por não ter penacho colorido. Até nas penas rígidas do rabo, ornadas de branco nas pontas.

Além do físico seu comportamento era de pica-pau. Talvez mais ativo, parecia apressado. Bicava depressa o galho onde pousasse, como o pica-pau grande, mas logo mudava de lugar com pulinhos de pardal - sempre pelos galhos, sempre usando o rabo para se apoiar, mesmo quando ficava completamente pendurado de cabeça para baixo.

Eu estava a menos de dois metros, imóvel e ele não me viu ou não ligou. Bicava com rapidez ao mesmo tempo em emitia um som, junto ou entre as bicadas, não sei - um pequeno gorjeio, que parecia lhe sair a revelia, como se não pudesse evitar. A planta onde estava era o mato de que falei outro dia, que se enche de flores amarelo-ouro nesta época. Um pé mais velho e alto, com uns três metros de altura. Assisti a tudo por baixo da pequena copa.

Ele bicou umas folhas e, uma única vez, levantou a cabeça e gritou um belo e agudo trinado. Depois, voltou à tarefa de cutucar casca de galho - alguns finos como canudo - com o bico. Ao fundo, havia sons de grilos e o canto de uma cigarra. O espetáculo durou alguns minutos, aí ele olhou para um lado, para o outro e partiu em vôo muito rápido em minha direção. Raspou-me a cabeça. Eu me virei na esperança de o seguir com o olhar, mas a miniatura de pica-pau já sumira na manhã de outono que, muito se parece a uma de verão.

Por fim, para quem quiser arriscar uma aquarela, ele tinha algumas penas levemente levantadas no cocuruto, a sugerir um penacho. O dorso e as asas tinham praticamente as cores de um pardal.

 

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