crônica do dia

 

Misto requentado

04/12/00

 

Então comecei a escrever. Era sobre um aviador da Primeira Guerra Mundial. Barão Von Himmlen. Ele voava em um Fokker vermelho. E não era popular entre seus colegas pilotos. Não falava com eles. Bebia sozinho e voava sozinho. Não ligava para as mulheres, embora todas o amassem. Estava acima disso. Era muito ocupado. Estava ocupado derrubando aviões aliados. Já tinha derrubado 110 e a guerra ainda não tinha acabado. Seu Fokker vermelho, que ele chamava de "Pássaro da Morte de Outubro", era reconhecido em todas as partes. Mesmo as tropas terrestres inimigas o reconheciam quando fazia rasantes sobre elas, enganando o fogo da artilharia, e atirando-lhes garrafas de champanhe suspensas em pequenos pára-quedas. O Barão Von Himmlen nunca era atacado por menos de cinco aviões aliados de cada vez. Era um homem feio, com cicatrizes no rosto, mas lindo se você olhasse pra ele tempo suficiente - alguma coisa em seus olhos, no seu estilo, sua coragem, sua obstinada solidão.

Um parágrafo pode valer todo o blablablá dos pobres de espírito, mesmo que estes venham a ganhar, depois, o reino que for? O parágrafo, que calhou, ao acaso, é do livro Misto Quente - A juventude de Henry Chinaski, de Charles Bukowski, tradução de Luis Antônio Sampaio Chagas, para a velha Brasiliense, de 1984. Um retrato em 160 palavras. Como quase tudo que escreveu, traz "cicatrizes" autobiográficas que, neste caso, já se anunciam, no Henry Chinaski do subtítulo, personagem do autor, em vários livros - seu alter ego, como se diz.

Há anos, com o scanner, veio um soft de oceérre (reconhecimento ótico de caracteres) em um cedê, o EaseReader. Era ótimo. Depois, perdi o cedêrrom e a possibilidade da cópia, em texto, de uma imagem de texto, a encantadora mágica que possibilitou o fax... Agora, já se vê: achei um crack para um programinha de ocerrê...

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