O opúsculo

15/03/11

Tenho menos de meio litro, 493 mil 552 milímetros cúbicos e meio, para ser preciso e peso menos de um quarto de quilo, 212 gramas. Não passo de um adolescente, farei 14 anos em julho, no dia 13. Agora, vou em viagem internacional, com os riscos próprios do viajar e as inevitáveis emoções fortes do adeus. Sou um caderno de rascunhos repleto de histórias anotadas e uma multidão de outras nas entrelinhas. Sou uma impressão de alma, deixada à revelia, como as digitais e guardo em cada borrão, em cada senão, uma revelação.

Aportei por aqui em outubro de 97, talvez novembro. Então, era tudo muito diferente mas, caderno, ignoro formalmente o que pena ou lápis não registrou. Filho da Itália, da família Tassotti, tenho 144 páginas de papel comum, dito de embrulho ou manilha, usado outrora para embrulhar pão, toucinho e macarrão. Variam, no entanto, suas cores: azul acinzentado, cinza amarelado, rosa, típico deste tipo de papel e cinza azulado, bem mais claro que o azul acinzentado. Elas se intercalam nesta ordem, de oito em oito, com três costuras na dobra e se abrigam sob uma de cartolina texturizada, decorada com as cartas do tarô e colada à lombada, como boa brochura que sou.

Nestas páginas fulguram flagrantes de aventuras e viagens de trem por paisagens europeias, inscritas em quatro cores de tintas: azul, preta, dourada e prateada, onde texto e ilustrações se misturam com a espontaneidade da caligrafia e do traço à mão livre. No canto superior das páginas ímpares, um número as conta até 93, pouco além da derradeira anotação, na 85. Em meio ao volume, dormem três selos italianos, de 100, 400 e 800 liras, com imagens de castelos.

Voltarei, agora, às mãos que me cinzelaram, como opúsculo e relíquia, pálida sombra do que se viveu, mas levo mais de dois terços virgens prontos para o futuro.

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