desenho de Lu Guidorzi
basta um clique! 

berro - a parte inútil da vaca
Publicação esporádica destinada a perder-se como berro de vaca que, todavia muge, apesar da inutilidade declarada de seu berro.

O último cordão

14/02/02

É tempo de quaresmeiras em flor. Será? As coisas estão mudadas e talvez sejam outras as flores ou, quem sabe, prefiram florir em outra época. Sem saudosismo, à simples constatação: as coisas estão mudadas. A cidade mudou, o carnaval mudou, a quantidade de gente mudou. Ao meio-dia da quarta-feira de cinzas ninguém esperava à porta da cadeia pelos arruaceiros do carnaval. Arruaceiros? De que cadeia? É, as coisas estão mudadas...

Oh, jardineira, não fiques triste que este mundo é todo teu... são apenas sinais do tempo, de que se cumpriu o mandamento de crescer e multiplicar. Não fiques triste, pois és muito mais bonita e tudo não passa, afinal, do progresso que chega pra nos salvar. De quê? Não se diz. As coisas estão mudadas e devem mudar mais. Agora diga, linda leitora improvável dos jardins suspensos, a que preço tamanha maravilha? Chegou-se a combinar?

Está tudo mudado! É um novo mundo com o olho de vidro do Grande Irmão por toda parte e seus ouvidos e microfones e dedos infravermelhos e bocas de Lobo Mau prestes a fazer mingau com caçadores a caça das Chapeuzinhos.

Caem nas cinzas da quarta estatísticas do carnaval sem serpentina nem confete. Vômitos numéricos dos bancos de dados de computadores. Números, números, números! De vítimas, de desaparecidos, de mortos, de afogados, de feridos, de decepados, de... Jornalistas, como bons ruminantes, devolvem tudo mastigado mais uma vez. Ditadura de computadores a que chamam tecnologia da informação. Combinou-se o preço de tamanho progresso?

Os arruaceiros detidos no carnaval eram libertados ao meio-dia da quarta de cinzas. Saiam, no centro do Rio, fantasiados e com a barba por fazer. Para não chorar, entoavam alguma marchinha de carnaval e assim se formava o último cordão de carnaval, infalível nas páginas do Cruzeiro. Mas tudo muda e não lembro o nome que lhe davam...

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