Não é tempo de chuva, mas há vários dias não se vê o sol. A água tomba ora plangente, ora quase muda, com raros momentos de estiagem. A natureza toda se me afigura ávida de luz e calor, a mim tudo parece ansiar pelo reencontro com nossa estrela, o sol.
Talvez apenas projete meu sentir em seres que não posso compreender, como o ramo vigoroso de liana alçado sobre a vegetação rasteira, cheio de gavinhas a tatear o nada em busca de um suporte qualquer.
A luminosidade é pouca e oscila. Cada escurecer evoca uma tristeza indefinida no silêncio quebrado apenas por um ou outro gotejar. Todavia a razão lembra a importância de regas regulares para saciar a sede de toda vida. Repete: cada ser depende de um gole periódico para continuar vivo.
Apenas sobre um fundo escuro se percebe a chuva, muito fina, que continua a cair - é mais visível ao pingar das pontas das folhas. Uma cambaxirra, aqui mais conhecida como corruíra, salta entre as folhas baixas com um breve piar singelo a cada pulo. Passa do meio-dia e os outros pássaros devem estar todos abrigados, aborrecidos, quem sabe, com a eternidade desse chover.
Sim, se estivesse no Saara certamente clamaria por água, teria saudade do ar úmido, fácil de respirar. Mas agora, do lado de cá do fim do mundo, cobiço a secura do deserto, sonho azul o galinho português, higrômetro divertido que alguém me deu ao voltar de Portugal, vestido agora de rosa, sua roupagem típica da umidade tropical.
galo higrômetro em dia muito seco
Os cães calam como os pássaros. Sem latidos nem pios, cogito se caracóis, lesmas e minhocas têm voz, pois não as consigo escutar. O termômetro marca 60 graus Fahrenheit, pouco mais de quinze e meio na escala Celsius. Em algumas folhas, enceradas talvez, gotas reluzem como pedras preciosas e, de tempos em tempos alguma lufada agita o mato como aceno.
|