autorretrato [] Crônica do dia

Peripécias banais

02/03/17

Este sítio envelhece, como tudo. Eis uma prova: há exatos dezoito anos, se publicava aqui uma crônica intitulada "Novidades" com o relato de fatos acontecidos muitíssimo antes, coisas de 1956.

("Senta que lá vem história" - anunciava a tevê Cultura, de São Paulo, quando ainda não tinha anunciantes). Na crônica se contavam casos ligados ao Colégio de São Bento daquela época, peripécias banais, porém marcantes para o adolescente personagem.

A urdidura de cada vida, a ligar o berço ao túmulo, possibilita tramas diversas e padronagens cujo efeito, muitas vezes, só se percebe com o passar do tempo, como se a distância temporal possibilitasse um ponto de vista mais afastado.

Hoje vejo inexatidões naquele relato, a começar pela ausência do nome completo de Dom Lourenço de Almeida Prado, reitor durante 46 anos mas, na época, apenas em seu segundo ano na reitoria. Eu tivera, antes, e por apenas um ano, Dom Basílio Penido na direção do Colégio.

Ambos me expulsaram e depois voltaram atrás. Dom Lourenço me amedrontava mais. Eu admirava Dom Basílio, marcante em alguns ensinamentos como, por exemplo, ao afirmar não ser mentira mandar dizer-se ausente a quem lhe bate à porta, e ressaltava: "é seu último reduto!" e assim justificava o mentir.

O episódio descrito na velha crônica levou Dom Lourenço a me chamar para um conversa - imagine a cena: o ambiente severo da reitoria, o monge com hábito negro e o menino de 12 anos - quando me falou que não me expulsaria, apenas por estar a minha mãe grávida e prestes a dar à luz. "Peça, então, para sair do Colégio", sugeriu e eu nunca pedi.

Dom Basílio me expulsou antes, quando eu tinha dez anos, após eu urinar na cesta de papéis da sala, quando o inspetor me impediu de ir ao banheiro e mais uma fiada trapalhadas já contadas aqui, em resposta a um leitor querido.

Thu, 2 Mar 2017 11:51:22 -0300

NOSSA, que LINDOOOOO!!!!!! Detalhes da sua história no São Bento que eu desconhecia. Sabia do xixi, mas pensava que era na parte do quadro-negro onde ficavam apagador e giz (como se chama? prateleira? gaveta? suporte? sou ruim pra nomes de objetos; detalhes arquitetônicos, então, ignoro-os todos que não sejam parede, janela, porta, telhado e teto).
Não desconfiava das quase expulsões e do "pede pra sair" (que se tornou um bordão depois de ser repetido num filme brasileiro que você não deve ter visto, Tropa de Elite) quando eu estava por vir :)
Parabéns por não ter pedido pra sair. Provavelmente, não ia adiantar mesmo. Uns 14 anos depois, eu pedi implorei pra sair do colégio de freiras e nossos pais não me atenderam. Então consegui ser expulsa aos 15. Mas não foi por querer, foi por delação (fui delatada por colegas e a premiada fui eu: consegui sair!). Fui pro Anglo-americano, onde nossa história começou.
Beijos da irmã e fã

Nossa! É recíproco! Eu também ignorava totalmente suas peripécias escolares. Curioso como as imagens se formam a partir de descrições: o cesto de papéis ficava efetivamente sob o escaninho (seria este o nome ou seria aparador?) do quadro-negro, perto da janela, no lado esquerdo. Mas eu precisaria ser muito alto para urinar naquele lugar...

Você já devia ter dito que foi para o Anglo-Americano, mas eu não lembrava de todo.

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