desenho de Mima

Pobre São João

26/06/17

O céu está encoberto, a umidade excessiva incomoda. A noite de São João aqui é sem foguetórios nem fogueira, sem bandeirolas nem balão, sem pé de moleque, milho, batata-doce ou quentão.

No supermercado de corredores estreitos, uma senhora baixa e volumosa e eu nos cruzamos. Exultante, ante a dificuldade de trânsito, perguntou: "Que delícia São João, o senhor não acha?" Respondi afirmativamente.

Na infância comprávamos papel de seda de muitas cores e recortávamos bandeirinhas de Volpi para enfeitar o quintal, onde a fogueira assumia a imponência de um altar.

Volpi fotografado para a inauguração da Galeria São Paulo
Volpi fotografado para a inauguração da Galeria São Paulo

Estrelinhas, buscapés, estalinhos e rodinhas enchiam de magia e encantamento aquelas noites de São João. Tanto que, tantos anos depois, ainda levantam cantos de lábios...

Eram muitos comes e bebes de nomes já esquecidos, existiam outras brincadeiras igualmente meio apagadas na lembrança; havia cantorias e nelas algo muito especial, ainda vivo e indecifrável nesta cabeça que teima em não encanecer.

Na noite de São João as nuvens não atrapalham um luar inexistente: é lua nova, início de outro ciclo de nosso maior satélite. Seria uma noite escura, lá, bem longe das cidades.

Durante a madrugada as nuvens foram anuviar outras paragens ou se desfizeram a manter alta a umidade relativa do ar. O domingo amanheceu esplêndido, de céu azul e um sol beleza muito oblíquo.

Ao caminhar até a ponta do Leme, encontrei pálidos vestígios das velhas festas juninas, em uma espécie de feira de barraquinhas ornamentada por bandeirolas de plástico, distantes umas das outras, paupérrimas! A maior parte do espaço era tomado por mesas e cadeiras vazias, sob toldos, à espera de fregueses... Nas barracas, de tudo, de roupas a comida mexicana.

Na madrugada de hoje, quando ainda límpida, Vênus luzia fulgurante, mas em vez de Sol vieram nuvens a toldar outra vez os céus.

Mon, 26 Jun 2017 12:10:06 -0300

Essa me deu saudades da Granja... Só fizemos festa junina lá duas vezes, por inspiração e com a ajuda de minha irmã
Lilian, que era muito festeira e se encarregava de aumentar o público com a turma do Vera Cruz, onde seus filhos estudavam.

Recortávamos folhas de revista pra fazer bandeirinhas econômicas que eram estendidas entre as árvores.
Cada convidado levava um prato de doce ou salgado; Hortência, minha salcação doméstica por muitos anos, estourava pipoca,
e na churrasqueira se cozinhava pinhão e milho e se preparava quentão. Cerveja era comprada em barril - e dependia de alguém
que soubesse lidar com aquela traquitana: volta e meia espirrava cerveja pela válvula...

Durante o dia barracas improvisadas eram armadas com bambu para as brincadeiras das crianças (Boca do palhaço, Pescaria, Rabo do burro e outras de que não lembro);
e minha irmã levava prendas que conseguia na Droga Raia (da família do meu cuinhado) e/ou comprava quinquilharias. Havia até um pau de sebo :
Berê (filho de Maria) e David (meu) eram os melhores nisso - Berê ganhou o primeiro lugar nos dois anos e em um deles a prenda era um reloginho de verdade -
ele adorou!

À noite acendíamos fogueira no campinho de futebol. Em uma das festas minha mãe compareceu e deu um show de violão e música caipira
em volta da fogueira. Soltávamos fogos, é claro, e numa das festas um amigo inconsequente dos tempos de colégio inventou de fazer e soltar balão...

No tempo em que trabalhei em Salvador na década de 70, antes de mudar para a Granja, fui a muitas festas de largo, não só em S. João - festa lá era o ano inteiro.
Foi nelas que descobri porque minhas amigas baianas preferiam usar saia: não havia banheiro nos largos!

É, ditados são demais: recordar é viver...

Bjs
Ana

Que delícia, Ana, suas recordações, muito melhores que minha croniquim!

Além de ditado a frase é do cancioneiro popular...

Adorei saber que sua mãe era violeira também.

De certa forma Salvador é outro país... profundamente africano.


Mon, 26 Jun 2017 14:40:27 -0700 (PDT)

adorei!
e a Mima tinha a sorte de fazer anos nessa epoca ... ganhava festa de aniversario "de sao joao"!
morria de inveja kkkk

      sem assinatura

Será que ela invejava você fazer anos de braços dados com Papai Noel?
As suas eram festas de aniversário com peru e rabanada...
Papai era matemático mesmo: meninas nos solstícios e meninos nos equinócios...


Fri, 30 Jun 2017 22:35:28 -0300

Pois é, Mermão, o São João dançou, e faz tempo. Mas confesso que acontece que essas coisas são assim mesmo... uma desaparecem e outras vão chegando. Tudo se altera permanentemente e talvez valha mais apenas acompanhar a permanente alteração de tudo ou quase tudo. Por exemplo: no reino da música, meu tesão permanente, e vai se alteram e se encantando com o que deve vir por aí e imaginar o que virá depois. E gosto dessa alteração infinita, de verdade. É mais curioso, eu acho.
Então... boa noite carioca por aqui...
pode ser?

bjos

      sem assinatura

Você está certo, o passado e o futuro não existem, mas eu tenho uma grande dificuldade de viver o célebre aqui, agora. Sem dúvida vale mais à pena acompanhar o presente, a permanente mutação de tudo e de nós mesmos...

Mas como é difícil!!!

Que legal que você consegue estar assim sempre no presente!

Boa noite, bons sonhos e bom sono.

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