desenho de Mima

Sexta-feira treze

13/05/11

Sexta-feira treze. A grande esfinge desafia além da casca dura do crânio. A caveira oca nas mãos de um eventual Hamlet é mero casco, embalagem vazia do ser. Este se volatiza com o cessar da química e eletricidade engendradas na matéria mole, no miolo. Miolo de vaca, ou de boi, era pasto comezinho nos tempos de criança. Adulto, ainda os comi em um restaurante italiano de São Paulo, o Gigetto, se não me engano, onde meu pai experimentou testículos de galo. Não lembro se os provei também mas, sim, de me parecerem enormes. A caveira feita símbolo não passa de casca.

Naquela refeição macia e de gosto peculiar, quando humana e viva, residem lembranças e esquecimentos, nela se forja a capacidade de compreender, ali se aninham razão e emoção e viceja o eventual ímpeto assassino ou sina suicida. O miolo encerra o indivíduo, seu jeito peculiar, sua história e memória. Esfinge, o cérebro desafia sua própria compreensão. O quebra-cabeça de ossos, vazio, sem um cérebro para o resolver, zomba do príncipe da Dinamarca num riso malicioso e murmura entre dentes: mais tempo, menos tempo sempre sobrevém a morte e então, num átimo, desaparece toda a beleza, toda riqueza, toda miséria, cada instante insignificante ou fundamental, cada banalidade, toda toda história, toda memória que foram o alguém que se evapora.

Como líquido muitíssimo volátil, some o quem era e já não existe mais. Diante do vácuo, na angústia da nulidade, inventa-se a alma e se lhe emprestam asas para imponente assunção a um paraíso imaginado, à comunhão com algum deus invejado. E desta imaginação fertilíssima, armam-se, então, fantasmagorias e bruxarias e mundos povoados por seres incapazes de viver, que retornam a cada dia treze que calha numa sexta-feira.

Que o dia lhe seja bom e de muita alegria nesta, sexta-feira treze.

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