Tucano

03/10/11

Meu olhar se elevou aos céus naturalmente, ao abandonar-me ao abraço macio da rede e se deparou com cores intensas entre os ramos de um pé de chico-magro, cheio de folhas novas e claras. O fundo sonoro se fazia com piados e gritos ásperos de bem-te-vis, que logo vi voejarem em tentativas de ataque ao tucano, imponente e impassível, com seu corpo negro absoluto, pelo menos ali, contraluz e papo branco cortado por larga faixa de um amarelo intenso, acima de outra área vermelha, de cor profunda e saturada. Como é bela esta ave, com seu bico absurdo, este, sim em tons pálidos amarelados.

Dois bem-te-vis pareciam muito irritados com aquela presença incomum e, decolando dos ramos próximos, investiam contra o forasteiro em voos rente ao alvo, mas sem tentar bicar o intruso, como já vi em outros ataques a gaviões que tentavam roubar filhotes. Nestes casos, os bem-te-vis atacavam com explícita intenção de bicar os olhos do gavião. Agora, o tucano ignorava os ataques. Pareceu-me sossegado, talvez em uma pausa de eventual migração, quem sabe?

Não durou muito tempo. Um bem-te-vi abandonou o pé de chico-magro em voo elegante rumo a outra árvore. Acompanhei-o com o olhar. Voltei-me em busca do tucano e o galho vazio calava sobre a ave colorida e sua partida. Perdi o momento em que o tucano se foi.

A chuva fraca de ontem deixou, hoje o céu mais azul, ainda que povoado de muitas nuvens brancas e brilhantes. A trilha sonora se enriqueceu do canto absurdo de cigarras, a ofuscar as disputas sonoras dos sabiás. Cedo, saguis vieram em bando atrás de ovos de passarinho. Muitos gritos e pios alertavam sobre o perigo e tentavam espantar os ladrões.

É primavera. A vida irrompe pujante e se assenhora de cada canto, ocupa soberana todo espaço. Muito sábio fazer a primavera seguir-se ao inverno... De repente, tudo parece maravilhoso.

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