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A recepcionista
13/05/16
A recepcionista com seus habituais sorriso e simpatia cumprimentou e, a ecoar o noticiário da televisão, disposta para acalmar os pacientes durante a espera, às suas costas, perguntou: "E aí, o que o senhor acha de tudo isso?" De onde estávamos não se podia ver a tela, mas o som não respeita obstáculo e o falatório sobre a queda de uma e a posse iminente do outro traduzia na entonação e modo de falar dos repórteres um forte conteúdo emocional a contaminar quase todo o país. Tentei explicar à recepcionista, que dia após dia me recebe (sempre simpática) para o tratamento, ser-me indiferente o incomum tumulto a agitar Brasília naquele início de tarde - a presidente fora afastada e o vice seria em pouco tempo empossado. Procurei resumir, o mais breve possível, um modo de ver de difícil apreensão mesmo em contextos mais propícios ao debate de ideias. Disse ver os atos e decisões dos governantes não como frutos desse ou daquele indivíduo mas, muito mais, resultado da própria estrutura da sociedade, esta sim, consequência do modo de ser de cada um, do "ser social", somatório de todas as individualidades. Percebi, então, desfazer-se em câmera lenta, o sorriso de seu rosto, sempre franco e cativante. Contei-lhe ter testemunhado ao longo de sete décadas a pulsação da esperança e consequente decepção nas figuras de inúmeros políticos, desde Getúlio Vargas passando por Jânio Quadros, pela dura ditadura - terrível! - e por inúmeros governadores e presidentes, para não falar dos outros políticos e demais sedentos de poder. Seu rosto agora era sério, quase sombrio. Ela disse algo, mas esqueci. Seu semblante entristecido me falava mais alto. Ao fundo, na tevê, repórteres se sucediam sem isenção emocional a acompanhar a presidente ovacionada por populares, ao deixar o palácio do governo. |
Fri, 13 May 2016 11:37:48 -0300 Oi, amigo Exato, como ninguém fala tampouco a estudanta ou adolescenta... |
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