Barulho, muito barulho
07/01/15
A ferramenta pneumática ou elétrica faz um barulho capaz de penetrar até os ossos. O ruído se sobrepõe a tudo mais. Outra ferramenta é acionada ao fundo e se soma à cacofonia. O dia segue azul e quente, muito quente. Um terceiro barulhão consegue se impor como a serrar perfis ocos de aço. Tudo mais se eclipsa ante a agressão sonora. Assim o hotel transforma seu espaço interno para ter quatro quartos onde existiam três. Um funcionário abre a porta da casa de bombas hidráulicas do prédio vizinho e o som dos motores consegue se destacar na barulheira monumental. É um zumbido grave e uniforme, com volume sonoro menor que britadeiras e serras da construção mas, por qualquer razão, se destaca. Gostaria de falar de folhas e flores ou aves e insetos ou gente e paixões, mas parece necessário algum tipo de silêncio para tanto e, se a balbúrdia externa é monumental, não encontro o silêncio em mim capaz, talvez, de calar tamanha conturbação e permitir a contemplação do suave escorrer de água por algum filete na mata. Algum operário grita muito para se fazer ouvir pelos demais. Como se poderia demolir, com controle, o trabalho de outros pedreiros há muito tempo, sem esse estrondo a exasperar a vizinhança inteira ao redor? Talvez num trabalho de formiguinha em um tempo muito maior, talvez. Aos poucos, a agitação física, mental e emocional serena e os barulhos, a se orquestrarem em pavoroso conjunto, não conseguem mais perturbar como antes. Somos surpreendentes por nos conhecermos tão pouco. Isto não é endosso do lema do jornalzinho do Colégio de São Bento, na década de cinquenta, o Avante: "as mais terríveis tempestades são incapazes de perturbar a paz das grandes profundezas", mas é possível, sim, silenciarmos por dentro mesmo diante de uma agressão sonora monumental. |
Wed, 7 Jan 2015 10:10:15 -0800 Clode sem assinatura O Avante era o jornal 'oficial', órgão da Academia de Letras, da ual fiz parte por um curto tempo. Wed, 7 Jan 2015 16:56:40 -0200 que emoção... Não confundes o Avante com O Mentiroso? Wed, 7 Jan 2015 18:51:06 -0200 Ótimos: o assunto, o texto e a possibilidade de conviver com a confusão barulhenta que são essas nossas cidades. sem assinatura O assunto se impôs, com grande alarido. A possibilidade tornou-se, então, inevitável. Thu, 8 Jan 2015 09:55:23 -0200 OI, Clôde Uma das coisas maravilhosas daí, sem dúvida, o silêncio! Mas aqui, de noite, é quieto, quase silencioso. A tal obra é a fonte da barulheira infernal. Mon, 12 Jan 2015 00:21:16 -0200 parabéns! por "descobrir" que é possível silenciar por dentro mesmo diante de uma agressão sonora monumenta'l. Preciso de muita meditação pra chegar perto dessa descoberta. sem assinatura Obrigado pelo copidesque. Corrigido. |
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