Aquele senhor gordo à mesa do restaurante em vão procura onde pousar o olhar, enquanto fala ao telefone. As outras pessoas, à mesa, apenas olham, mudas, o senhor de gravata apertada e vasta papada, que fala sem parar ao celular. A bem dizer, mal olham, escutam com o olhar. O papudo fala alto, invade a todos no pequeno restaurante. Ainda há pouco, naquela mesa se conversava animadamente. Comia-se e bebia-se e, como se esperavam os pratos principais, mais se bebia do que comia. Pareciam todos muito animados: iam de sorrisos a risos e destes às gargalhadas. Aí, tocou o celular! Fez-se silêncio tumular. O poder da nova tecnologia desafiava o rito milenar. A telefonia por rádio! O uolquitolqui do herói dos quadrinhos ao alcance das massas. O sonho capitalista dá a maquininha e cobra o filme e a revelação. O lucro em tubinhos de água colorida para jatos de tinta. Banqueiros não sorriem. Todos mastigam mais devagar, o senhor gordo, de papada gelatinosa, agora, discute pelo celular. Uma senhora se levanta, de outra mesa, e vai às pressas em direção ao banheiro, por certo, para vomitar. O homem xinga pelo telefone. Os outros escutam e não sabem muito bem para onde olhar. Ele chama a mulher, do outro lado da linha - linha? da onda, dir-se-ia -, chama de vagabunda e de outros mimos mais. O dono do restaurante experimenta "pôr um som". Triste idéia. Há protestos generalizados. O dono da casa de pasto pára com o pagode. Ninguém mais leva comida à boca. Todos estão presos aos berros do gordo. Furioso, ele se levanta e continua a esbravejar. Ao mesmo tempo, anda entre as mesas. Está transtornado, descontrolado. Quando vem em direção a uma moça magrinha, ela disfarça e estica o pé. O senhor de papo grande tropeça e se esborracha num delicioso suflê fumegante, com celular e tudo. |
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