Disse me disse *

15/01/18

Em seu livro "Sapiens - Uma breve história da humanidade", Yuval Harari destaca a importância decisiva, para a evolução de nossa espécie e, em particular, de nosso privilegiado cérebro, a importância decisiva, dizia, da fofoca.

"Nossa linguagem evoluiu como uma forma de fofoca. De acordo com essa teoria, o Homo sapiens é antes de mais nada um animal social. A cooperação social é essencial para a sobrevivência e a reprodução. Não é suficiente que homens e mulheres conheçam o paradeiro de leões e bisões. É muito mais importante para eles saber quem em seu bando odeia quem, quem está dormindo com quem, quem é honesto e quem é trapaceiro."

Depois, assinala como extensão do mexerico e com importância ainda maior para nosso sucesso, a capacidade de falar sobre coisas que não existem ou, no dizer de Suassuna ao comentar a sua própria ficção, a capacidade de mentir. Os alicerces de nossa sociedade, consequência de um cérebro superdesenvolvido, sagaz e ardiloso seriam, assim, a fofoca e a mentira.

Apoiados nestes pilares, não deveríamos estranhar a política dos políticos, aqui ou em qualquer lugar do mundo, nem os costumes estabelecidos pelos mais poderosos, com os quais dominam nossas mentes e impõem comportamentos de seus próprios interesses.

Avança o ano de 2018, janeiro quase em meio e seguimos, Homo verbalis, a valorizar a palavra em detrimento do fato, da realidade. Acreditamos no que é dito, na história bem contada, nas tramas engenhosas e mal percebemos a vida ao alcance de nossos olhos.

Virão Carnaval, Páscoa, Copa do Mundo e depois chegarão as eleições onde os mesmos, ou equivalentes, serão escolhidos para manter acessas as crenças, repetir promessas e tecer novas ficções, a nos embalarem em mentiras diversas e a fornecer assunto para um vasto mar de fofocas e vãs especulações.


* do Houaiss:
•   disse me disse
sucessão de intrigas; boataria, falatório; disse não disse,
disse que disse, diz-que, diz que diz, diz que diz que, diz que me diz que

NOTA: Diz-se ser hoje, 15 de janeiro, o dia da fofoca

volta

Mon, 15 Jan 2018 12:19:45 -0200

Ótima cronica! Mando esse comentário do Harari sobre o nosso futuro. Arrepiante...

Grande abraço

Ebert

"As novas tecnologias do século XXI podem, assim, reverter a revolução humanista, destituindo humanos de sua autoridade e passando o poder a algoritmos não humanos. Se você está horrorizado com essa possível direção dos fatos, não culpe os fanáticos da computação. Os responsáveis na verdade são os biólogos. É crucial dar-se conta de que toda essa tendência é alimentada mais por insights biológicos do que pela ciência da computação. Foram as ciências biológicas que chegaram à conclusão de que organismos são algoritmos. Se não for esse o caso — se organismos funcionam de maneira inerentemente diferente à dos algoritmos —, então os computadores poderão até mesmo fazer maravilhas em outros campos, porém não serão capazes de nos compreender e de direcionar nossa vida, e certamente não serão capazes de se fundir conosco. Mas, depois de concluir que organismos são algoritmos, os biólogos derrubaram o muro entre o orgânico e o inorgânico, transformaram o viés da revolução computacional de uma questão puramente mecânica num cataclismo biológico e transferiram a autoridade de humanos individuais para algoritmos em rede."

"Algumas pessoas ficam realmente horrorizadas com esse desenvolvimento, mas o fato é que milhões o abraçarão de bom grado. Hoje, muitos de nós já abrimos mão de nossa privacidade e individualidade, registramos cada uma de nossas ações, conduzimos nossa vida on-line e ficamos histéricos se nossa conexão com a rede se interrompe mesmo que por alguns minutos. A transferência da autoridade de humanos para algoritmos está acontecendo a nossa volta, não como resultado de uma decisão governamental, e sim devido a uma inundação de escolhas mundanas
."

      trecho de Harari, Yuval Noah. "Homo Deus: Uma breve história do amanhã.", págs. 728/729.

Obrigado e obrigado, pela opinião e pelo comentário.

De todo modo, continuo a olhar o futuro apenas como um ponto de interrogação.

Em cada esquina, em todo desvio, o acaso pode nos surpreender com o que não soubemos prever. Quase sempre as previsões falham, por uma ou outra razão.


Mon, 15 Jan 2018 12:43:16 -0200

Falou (escreveu) e disse (compartilhou)!!!!

Bjs
Ana

Pois é... vivemos mais de palavras do que fatos.

Obrigado.

bjs, c.

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