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Gavião branco17/10/01
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"aspas" "Guerra é a continuação da paz. Só que com muito mais dinheiro." Millôr Fernandes |
O pássaro passou baixo, em vôo rasante. Assim, parecia imenso. Depois de algumas evoluções pousou a uns sessenta metros de onde estávamos e fechou as asas com um ritual que o transformou num ponto difícil de perceber. Por baixo era claro, quase branco. Por cima, dorso e as asas, bem escuro, quase preto. Já o vira, ou outro da mesma espécie, em um grande eucalipto ali perto, quando me disseram que se tratava de um gavião branco. Na paisagem feia e de péssimo cheiro do aterro com placa de exclusividade das obras do anel rodoviário, nessa paisagem o gavião branco era o imperador solitário, enquanto o sol se aproximava sempre claro do horizonte. Tratores e caminhões gigantescos tinham transformado o grande buraco num deserto de terras coloridas e restos diversos. Antes, no tempo das chuvas, o imenso buraco se enchia de água, mosquitos e crianças, transformado num pequeno lago imundo e cheio de lendas. A vegetação rala desapareceu com o buraco sob aterro, restos de obra, pedaços de concreto e substâncias fedorentas. Outro dia, nas escarpas produzidas pelos caminhões e tratores, havia um congresso de urubus. Como a área é muito grande e está cercada, não foi possível saber se tinha alguma carcaça. Hoje, no mesmo lugar, havia apenas o gavião branco. Apenas o gavião, até chegar um cão negro, magro, absolutamente preto e esquálido como os cães abandonados que rondam a pobreza - bairro rico não tem cães vadios - veio o cachorro magro para o lado do promontório de meio metro, de onde o imperador vigiava. A ave imponente deu um pequeno pulo para trás, com um esboço de abrir as asas e desapareceu por um instante. Logo depois, como o cachorro seguiu seu rumo, com outro pulo, voltou a seu posto de observação. |
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