Fenômeno efêmero e fascinante, os spotlights criados pela aproximação de uma tempestade: de repente, um único canto do céu brilha. Trata-se, em verdade, de um 'buraco' na densa camada de nuvens a obnubilar o firmamento. Tal circunstância cria iluminações inéditas na paisagem com a luz vindo de onde o sol jamais está. Todavia, com o deslocar-se da tormenta, logo a peculiar fonte de luz se apaga. Se vier mesmo uma tempestade de verão, como ontem, na inauguração da estação, logo tudo se escurece, trovoadas de avolumam e o dia simula noite. Os primeiros pingos mentiram sobre a borrasca a se avizinhar: minúsculas gotículas deixavam dúvida se chovia ou não, mas as transformações vieram em célere sucessão e, logo, água e vento viraram show.
Cumpre esclarecer a visita, há três dias, de um senhor sexagenário incumbido de pôr a água, de novo, a se derramar na caixa, pois se extraviara no caminho e, como se sabe, caixas-d'água têm paixão pela altura. Para se desincumbir do serviço, seu João, o encanador, homem alto e corpulento, andou pelo telhado como gato. Emendou canos e não tardou para a água cair na caixa num solo afinadíssimo. O resto só viria ontem, ao desabar o toró... Depois de alguns minutos de aguaceiro, via, perplexo, mais chuva vir do da cozinha do que fora, no quintal... Exagero, é óbvio, para dar medida da inundação, do batismo de fogo nas delícias de um verão... Uma hora depois, mais ou menos, o céu clareou. As comportas de fecharam e restou do pé-d'água o rugir de trovoadas, cada vez mais distantes. Um sabiá bico de osso se pôs a declarar seu o território, alheio ao estrondo dos trovões. Se afeito aos ritos de Dionísio, tomaria uma taça de bom vinho sem me afogar no barril, pois a dose é tudo e dela se afastar é que faz mal. Nenhum rio a transbordar no meu quintal - ufa! |
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