Na casa da vizinha, me deparo com o mundo da ficção mais real em sua virtualidade que o crepitar do fogo na lareira temporã, acesa mais com o intuito de secar que aquecer.

Na grande tela da televisão, diante do sofá amplo e confortável, um pequeno artefato em mãos treinadas comanda na tela um ponteiro de mouse - ora seta, ora mãozinha - e, em rápida seqüência sou construído a partir de blocos pré-fabricados: formato do rosto, da barba, do cabelo, do bigode... Ei, não serei eu, faltam os pêlos nas orelhas!

Ouvira falar de possibilidades ilimitadas nesse mundo virtual. Informo o dia em que nasci e o boneco - eu naquele mundo - é arquivado em algum banco de dados. Brincam: agora você já é da família e me exibem membro da família de bonecos.

Então, o pequeno artefato branco cujo nome ignoro dispara uns comandos e outro ícone, feminino, aparece numa quadra de tênis e começa-se um jogo onde a bola na tela da televisão é rebatida pelo movimento da mão de quem segura o artefato sem nome.

Pré-adolescente, causava-me espécie o famoso "2-way wrist radio" de Dick Tracy. Repeti inúmeras vezes: imagina se algum dia isto será possível! Estava, então, convicto da impossibilidade de um transmissor de rádio pequeno o suficiente para ser preso ao pulso do herói como relógio (ouvia falar de válvulas de transmissão tão pesadas como uma pessoa). Alguns anos depois surgiriam os primeiros rádios transistores (então, pronunciava-se transístores, proparoxítona!)

o famoso "2-way wrist radio" - imagem da internet

Hoje, talvez duvide apenas que a tecnologia me leve, em frações de segundo, daqui a um ponto qualquer, à quitanda do Maranhão, por exemplo. Duvido do teletransporte. Diz-se ter teletransportado elétrons, mas elétrons não têm passaporte e é impossível conferir no desembarque. No mais, por cautela, pré-acredito pelo menos na possibilidade...

O movimento violento do artefato sem nome bateu forte na bola de tênis, na imagem da tevê.

Curiosidade: esta é a milésima crônica.