Toca o telefone - a expressão é muito antiga e nem sei se ainda se usa! - mas o telefone toca e insiste com a insistência característica e irritante dos telefones antigos: primmmm... primmmm... Não corro para atender, dizem ser perigoso para um velho correr e, o primmmm continua e toma aparência, a cada vez, de entonação mais agressiva. Chego ao aparelho e atendo o chamado. Do outro lado, parece estarem apenas interessados no cumprimento, insistem: "bom dia". Pergunto com quem querem falar e - surpresa para mim! - a resposta é o meu nome (esclareça-se, aqui, não estar em meu nome a linha telefônica, daí a surpresa). Pergunto quem quer falar comigo - já estava falando, é óbvio! - e vem a resposta, para mim, totalmente surrealista: é da farmácia tal e tal. Que mundo fizemos! Nem Dali, nem Buñuel ou Breton pensariam em tal ato surrealista! Logo me ocorre, todavia, que eu pudesse ter deixado cair por lá qualquer coisa - um documento, uma chave, por exemplo - e o telefonema fosse apenas para avisar, mas não, logo se desmascara o absurdo: "eu estou ligando para convidá-lo - acho que num português com acento mais norte-americano - para convidá-lo, ela disse, a passar aqui para conhecer as novidades..." a voz feminina seguiu por aí afora mas já não escutava mais, diante do que me parecia um absurdo incomensurável. Agradeci. Desliguei. Sou de outro século e não estou acostumado a essas invasões, a essa fúria vendedora. Erigimos uma sociedade com uma visão utilitária do outro. Cada um vê os outros pelo filtro de seus interesses e com essa visão se fizeram as relações entre as pessoas, teceu-se a trama social. Todavia transparece aqui um aspecto positivo no telefonema abominado e tachado de surreal: sem ele não teríamos esta conversa fiada num dia, aqui, úmido demais. |
Wed, 28 May 2014 13:40:40 -0300 E viva o telefonema! bj sem assinatura :-) Wed, 28 May 2014 13:46:11 -0300 Ela vendia alguma coisa interessante pelo menos? Não sei. Depois de ouvir o convite para visitar a farmácia, estupefato, não ouvi mais nada! Thu, 29 May 2014 19:52:09 -0300 Ah... siiimmm... sem assinatura Comprar e vender são duas coisas para as quais sou totalmente incompetente e me exigem grande sacrifício. Fri, 30 May 2014 13:50:32 -0300 É foda, né? Eu sou do mesmo século que você. Logo pergunto: É telemarketing, meu bem? Não quero nada! Bom dia, boa sorte, boas vendas. Ato contínuo, desligo. Isso é porque, com o passar das décadas, fui ficando mais transigente. Saudadíssimas ro Nossa! Saudades também. Preciso atentar mais à transigência. . . Fri, 13 Jun 2014 17:47:35 -0700 pra mim o mais surreal disso tudo, eh farmacia fazendo anuncio de venda sem assinatura Claro que não deveria haver propaganda de remédio, ou melhor, não deveria haver propaganda. Ponto. Por que deixar a outros 'pensar' por nós? |
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