autoria: José Lauro

Transformação

14/06/17

Aconteceu ontem à tarde uma súbita transformação do imponderável. Dissolveu-se aos poucos o espesso manto de nuvens a difundir a luz do Sol, e logo se insinuou o azul. A abóbada celeste se faz de mil tonalidades imprecisas, indefinidas a esfuminho em misturas de brancos e cinzentos claros com o azul contundente do céu transparente, puro, feito só de ar.

Gradativamente surgiram esboços de sombras, insinuações apenas, sem contornos definidos, mas aptas a indicar a direção muito oblíqua do Sol. Tanto bastou para se estabelecer novo humor, para emergir uma vitalidade já esquecida e encher a atmosfera de sorrisos insabidos. Acima de tudo, a umidade declinou rápida e vertiginosamente e com ela diminuiu na hora a sensação de frio, embora o termômetro desmentisse a percepção da pele.

A misteriosa alma, sempre intuída e jamais demonstrada, por certo depende para ser saudável da luz e do calor solares. Os dias nublados e cheios de umidade, tão essenciais a plantas e fungos, sugam do espírito todo elã.

Varreu-se de todo a nebulosidade e, em um céu ainda azul esbranquiçado, imperou o Sol com sombras bem contrastadas e recortadas com nitidez. Um profundo suspiro restabeleceu a condição antes sufocada por um clima opressor. Viva a vida, sempre bela e surpreendente nos mínimos detalhes!

A transformação ultrapassa condições climáticas, contagia cada animal e, como um sopro extra de vida, bafeja e distribui energia. A alegria traz à memória uma personagem de história em quadrinhos sempre sob uma nuvem cinzenta, malévola, a acompanhá-la por toda parte e a chover sem parar sobre a coitada. Não lembro, no entanto, qual era a sua historinha, nem se a personagem era menina ou menino.

Por fim, cumpre contar ter sido uma transformação de bem curta duração. Logo vieram mais nuvens e o dia escureceu...

Wed, 14 Jun 2017 18:03:57 -0300

achei lindo, você é especialista em descrever o céu, o sol, o clima. impressionante.
Talvez nem todas as almas prefiram o sol e deplorem a umidade, porém.
Acho que era uma historinha da Luluzinha, com bruxinha Meméia.

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Obrigado.
É bem possível... há gosto para tudo.
Creio que você está certa. Devia ser a bruxinha a desfilar com sua nuvem e sua chuva. Agradeço a lembrança.


Thu, 15 Jun 2017 14:13:01 -0300

Conheço um de preto dos quadrinhos do Ferdinando (li'lá Abner)escrito e desenhado por All Capp, satírico genial e grande quadrinista, estadunidense.Lá havia um personagem de preto que era acompanhado por uma nuvem de chuva esecura e permanente

      sem assinatura

É bem possível que tenha sido esta a personagem que se apagou em minha memória. Lia sempre o Ferdinando, publicado diariamente em "O Globo" de minha infância, trazido por meu pai a cada noite. Adorava as histórias e, principalmente, os desenhos de All Capp, que tentava copiar regularmente...

Obrigado pela lembrança.


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