Um belo dia
06/10/11
Um belo dia, acordarei morto - acontece com todos, desnecessário se assombrar. Neste dia, é claro, não serei mais eu a acordar e nem será este solo fértil a mãe gentil. Isto posto, tudo se pode esboçar, rabiscar sem censura, entressonhar. Pode-se ter, como quis o poeta, mulher e cama cobiçadas ou não ter mulher alguma para ser só sem solidão. Pode-se cavalgar o cavalo branco do príncipe principal e principiar a fantasia de seu mais recôndito devaneio. Ali se mede espaço e tempo com compasso de luz, passo a passo, no escorrer do tempo ida e volta, onde funciona a máquina do doutor Papanatas - brucutu, brucutu, brucutu, brucutu no resmungar do mecanismo mal lubrificado onde areia da grossa e areia da fina não faz mais ninguém pequenina. Olhos curados de toda miopia, de qualquer estrabismo e da hipermetropia perscrutam o longe em busca do encontro das paralelas, no canto antigo de Les Luthiers: "si tres o más paralelas ... son cortadas, son cortadas..." Corta! E o corta corta luzes, corta câmara, corta a ação quando um helicopererê rasga em voo rasante e faz a terra tremer - ensurdecedor! A vida sacode com violência e acordo vivo, caído do sonho, enquanto a vida pulula e a multidão se agita... Steve Jobs morreu. Hoje já é amanhã e amanhã será depois e um belo dia a corda acaba e o brinquedo para para perguntar, perguntar pela mão que torce a borboleta e enrola a mola e amola a multidão, sempre a fervilhar, e o brinquedo começa de novo a brincar. Aurora é boreal ou mulher de verdade no dia que se anuncia por franjas primeiras do clarear? O curiango cala, o sabiá começa, o bem-te-vi alteia voz estridente e muitos grilos se estendem no desfazer da noite. Faz-se a quinta-feira seis de outubro de 2011. Clareia-se outro dia para nossa coleção que, um belo dia, acabará. |
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