desenho de Mima

A ruína de uma cena

06/07/16

Uma ruína de cena me acena de quarenta e sete anos atrás: sobre a fórmica branca, algumas folhas de jornal e um ou mais tijolos comuns, paralelepípedos da mesma matéria-prima de Adão.

O tempo age como neblina e torna a cena incerta, lhe corrói detalhes, sugere fantasmagorias e realça mais emoções que fatos. A fórmica branca revestiu mesinhas herdadas pela enfoco do Curso Kubrusly, curso preparatório para vestibulares das décadas de 40 e 50, no Rio e, com a nova roupagem, compunham a segunda sala de aula da Escola de Fotografia, sala depois destinada a exposições.

As folhas de jornal eram usadas para embrulhar os tijolos, bem lembro, em demonstração viva de alguma tese apagada pela distância temporal. Foi uma aula extracurricular sobre criatividade. Um famoso repórter ali expôs com brilhantismo sua visão sobre ser criativo e ao mesmo tempo propôs aos alunos algum desafio com aquele material.

Não pretendo resgatar fragmentos em busca do passado, mas me intriga muito nossa memória pois, ao contrário de outras - magnéticas, digitais etc. -, sofre influência decisiva das emoções envolvidas e associações idiossincráticas. Surpreende-me não lembrar de uma aula por mim testemunhada e ter tão viva a imagem dos tijolos (ou seria apenas um?) e das folhas inteiras de jornal para algum desafio proposto aos estudantes.

Há, entre os leitores destes textos, alguns ex-alunos da enfoco. Quem sabe alguém tenha mais vivo o conteúdo daquela aula e, queira nos contar como aquele material propiciava uma lição de criatividade. Eu continuo deslumbrado com nossa capacidade de lembrar fatos, emoções, textos e enredos embora, quase sempre, distorcidos pelo tempo e pela individualidade de quem os recorda.

Revolvi a ruína da cena, levantei poeira, mas ela logo se assentará, pronta a virar tijolo se com água se misturar.

Wed, 6 Jul 2016 19:28:51 -0300

Que belo reencontrar do passado logo ali.
Mas eu sou tentado a ficar no presente ou
rebuscar o que ainda vai aparecer... logo ali ao lado. E pode ser uma primeira vez. E vez primeira é inaugural, vai daí: que venha este bebe sonoro. E leve alguém com o seu cachorrinho pra balançar o rabo... em busca de surpresas inaugurais.
Ê coisa danada de boa...

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Você está certo. É preciso uma grande perspicácia para estar sempre no presente e não é fácil. O novo é fascinante e insubstituível.


Thu, 07 Jul 2016 11:54:08 +0000

Infelizmente não estava presente na ocasião , e agora restou uma imensa curiosidade ... Abçs.

      sem assinatura

Somos dois. Lembro da cena, mas sou incapaz de lembrar a explicação...
Caso apareça, na certa se tornará uma croniquinha.

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