Crônica do dia

ARARA

16/02/05

 

Bem cedo, gritos impressionantes me tiraram da cama. Não eram gritos humanos, que além de impressionar incomodam de forma peculiar - coisas da espécie, suponho. No entanto, eram muito barulhentos e incomuns por aqui. Não percebi logo de que se tratava.

O mato está alto e abundante com tanta chuva. Pelo ouvido diria que o bicho devia estar perto, rumo noroeste, mas os olhos nada descobriam. Depois de algum tempo, decidi que a voz se parecia com a de uma arara.

Voltei à minha toca para fazer café. Daí a pouco, ouvi a gritaria ainda mais perto e, me parecia, vindo de outra direção. Deixei ao fogo sua tarefa e saí de novo para assuntar, dessa vez, por outra porta. Procurei e lá estava uma enorme ave, encarapitada no topo da mais alta árvore das redondezas.

Do sul, a contraluz, era impossível discernir suas cores. Parecia grande, bem maior do que Paco, um papagaio que fugiu da gaiola, deu show por aqui e virou croniquinha, há uns sete anos. Talvez se tratasse mesmo de uma arara ou, se fosse mesmo papagaio, era dos grandes e com vocação para locutor.

A manhã chegara em cores de bebê, toda em rosas e azuis clarinhos, transparentes a anunciar outro dia de verão, de sol forte sem muito calor e com um ventinho quase frio de direção indefinida. Tudo a preparar outro entardecer de cair o queixo, como têm sido os entardeceres, luminosos e translúcidos, antes de anoiteceres também esplêndidos. Entre eles, pores-do-sol de tirar o fôlego, com horizontes até muito longe.

Desisti de esperar qualquer ação da arara ou papagaio, lá no cume do pé de chico-magro. Voltei ao café. Nisso, com o rabo do olho, vi o bicho voar para o poente, sem estardalhaço. Olhei, mas ela já ia longe e sumiu. Não tinha penas longas no rabo e por isso achei que era papagaio mesmo. Comecei a ferver outra água... A ave não apareceu mais.

 

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