(de esporadicidade imprevisível)

Encapados

04/04/18

Há apenas 188 dias, se falava aqui da pantomima encenada amiúde, nas dependências do Supremo Tribunal Federal, onde os atores se dão ares de magnanimidade e profunda sabedoria sob uma grotesca capinha, em geral, mal ajustada sobre a vestimenta, à qual atribuem dignidades e simbolismos herdados de velhas cortes do velho mundo.

No quarto dia do quarto mês, quarto também do segundo trimestre, a deixar um quarto do ano para trás, os magistrados sob suas capinhas risíveis e investidos apenas de humaníssimos poderes, mais uma vez entrarão em cena para decidir um verdicto aguardado com forte angústia e muita excitação por uma grande multidão.

Como torcidas de futebol, o povo se dividiu e, ansioso por uma ou outra decisão, aguarda o resultado, preparado para o alarido e o tumulto costumeiros dos grandiosos embates esportivos. Pouco importará a teatralização e a verborragia dos membros da corte sob suas fantasias, para mim extravagantes e ridículas.

Não sou torcedor e, qualquer que venha a ser o resultado, sei que ele não mudará o ser humano, não nos tornará pessoas mais lúcidas ou mais capazes de compreender, em nada vai alterar a essência do ente humano e, portanto, pouca coisa mudará.

Mas é muito difícil se esquivar da voz ubíqua da mídia guiada por interesses insondáveis dos muito poderosos, vale dizer, dos mais ricos. Hoje, o 'efeito manada' se amplificou com o advento das redes sociais e dos smartphones e não é possível prever os riscos de eventual estouro da boiada como consequência das doutas decisões dos encapados.

Jânio, um dos jornalistas que acompanhei como fotógrafo na década de sessenta, advertia toda vez que parávamos em um botequim para reidratação: "nunca como esses encapados" e apontava para as coxinhas e outros salgados envoltos em massa e fritos. Tinha pavor dos encapados.

 

Wed, 4 Apr 2018 10:02:15 -0300

MUITO BOM, muito bom o uso do termo "encapados", principalmente com o brilho do final do texto!!! Também os acho ridículos - os magistrados, não os salgadinhos - com estas capinhas, pompa e empostação.
E você queria ou não queria o trocadilho com a palavra “coxinha” e sua “nova semântica”?
Parabéns.
Você não perde o fio (não da meada, mas da lâmina de sua escrita genial).
Mima

Marcou-me a repugnância com que o Jânio (não lembro seu sobrenome...) falava do encapados (talvez, para se referir aos salgados, ele usasse encapuzados) com grande temor por ignorar o que poderia se esconder sob a capa ou o capuz.

Lembrei-me, sim, do novo significado atribuído a coxinha, mas não as mencionei por isto.

Obrigado. (Percebe-se que corei?)


Wed, 04 Apr 2018 09:46:29 -0700 (PDT)

adorei a comparacao dos encapados

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Que bom!


Wed, 4 Apr 2018 16:00:28 -0300

Adorei.
Abraço.
Até.

      sem assinatura

Bom.
Beijo.
Bye.


Wed, 4 Apr 2018 19:07:28 -0300

Salve salve

      sem assinatura

Salve!!!


Tue, 17 Apr 2018 12:32:18 -0300

Querido Clode,
Mais de um mês de seu aniversário, eu venho aqui afirmar que desejo-lhe todo o Bem.
Atrasei muito este ano para verbalizar, não é?
Vida corrida, vida atribulada e não sei nem pra que tanta coisa. O bom mesmo é dormir quando vem o sono, comer quando vem a fome, enfim... Não é o que ocorre.
Por aqui, tudo certo, apesar dos acontecimentos nacionais e mundiais.
Uma gatinha que morava comigo se foi, no início do mês. Os outros e a cachorrinha seguem aqui, lindos, amigos, companheiros.
A jabuticabeira precisou de uma baita poda, pegou "broca". Parece que deu certo, ela até produziu depois que cortamos a parte doente.
E você? Como está nessa cidade linda e maltratada?
Um beijo,
Rô.
PS-gostei muito da crônica: "encapados". São, mesmo, esdrúxulos!

Não atrasou nada. Hoje é dia de meu desaniversário, como queria Lewis Carroll em "Alice no Através do Espelho"...

Precisamos nos ater com maior afinco no "dormir quando vem o sono, comer quando vem a fome" e viver enquanto continuamos vivos.

Tampouco eu sei para que tanta coisa... mas a resposta, certamente, só acharemos dentro de nós...

Os nossos bichos tem vida mais breve que nossa e quando morrem nos confrontam com esta certeza. São mesmo amigos e companheiros.

Não posso mais saber como anda a jabuticabeira "do outro lado do mundo"... espero que bem, com seus novos donos. As podas, em geral, estimulam mesmo os vegetais a "lutarem pela vida" e isto inclui as gerações futuras.

Aqui também seguimos, apesar das adversidades. O mar, ontem, tinha um resto de ressaca. "É bonito, é bonito, é bonito..."

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