crônica do dia

Espectro

02/12/02

Nem mesmo teu nome restou. Ao despertar, ainda estavas por ali, ou me parecias estar, vívida, capaz de evocar a emoção do sonho que nos apresentou um ao outro pouco antes, para viver um encontro intenso e cheio de insinuações até o aniquilamento dos que só vivem nos sonhos. Pela manhã, apenas destroços esbatidos - nem teu nome restou...

Vê, falo a fantasmas. Nada. Nenhum tênue traço de fumaça a indicar o sonho que se desfez. Quem mais poderia estar vívida pela manhã senão eu mesmo no disfarce da mulher que se engendrara em meu sonho e, portanto, ainda era eu, o mesmo, e apenas eu. Só.

É fácil fazer conjeturas, dar palpites acadêmicos de salgueiros e chorões. Mas... de que vale perguntar se acordaremos do longo sonho a que chamamos realidade ou se porventura a morte nos viria dele redimir. Qual realidade é mais real ou dos sonhos, o mais onírico.

Ao acordar, tudo desfiz em fumaça invisível, inodora, imponderável - perfeitíssimo gás! - a mulher de meu sonho, que não é e nunca será a mulher de meus sonhos, a mais-que-perfeita, a matéria primeira - hidrogênio alquímico. Aquela, que o samba de Ataulfo Alves negou existir.

Nada, nenhum vestígio. Divagações inúteis que não resgatam o regaço macio, algo perfumado... ou não seria nada disso? Talvez fossem pernas bem esculpidas, talvez um colo acolhedor de coxas firmes ou o abrigo seguro de um olhar na moldura de voluptuosa cabeleira? Evaporou-se o sonho. Poderia não ser mais que uma voz, aconchego da alma... enfim, se foi sem deixar rasto. Nem mesmo teu nome restou.

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