auto-retrato [1988] 

Símbolo

16/01/08

Em primeiro plano, a mão do repórter enche boa parte da tela. Nela, um microfone imenso. Inexplicável em sua dimensão! Nele um cubo ou outro sólido propicia à lente o logotipo da emissora em close. No fundo, o entrevistado - o povo a palpitar ou o cientista a se traduzir ou o craque a tatibitatear ou político a se gabar, tanto faz. De canal em canal, assim se repete o jornalismo da televisão.

Corta. No estúdio, cabe ao funcionário a que chamam âncora, independentemente do sexo, sentado a uma mesa de desenho futurista, à Jetsons, circunspecto, se homem, sorridente, se mulher, dar um 'toque de profundidade' à informação, mesmo se tirada da gaveta, sem nenhum frescor. Às vezes, são dois, um casal e a cada âncora seu cacoete, alguns, cultivados como etiqueta de grife.

Em tal ecossistema a notícia morre. Quando o fato se impõe, comove e envolve o espectador, se atropelam todos esses ritos e a informação sai como marmita fria, sem os requintes da culinária nipônica de agradar ao paladar pelo olhar.

Basta lembrar do atentado ao World Trade Center, dos grandes acidentes aéreos ou de qualquer fato que seja, mesmo, notícia. Aí, se informa e o que importa é a informação.

Tudo isto me deixa boquiaberto frente ao noticiário da tevê. Qualquer um, com âncoras que são péssimos atores e incapazes de serem humanos. Com pose e constrangimento de velório, encenam uma descontração e informalidade com ares de criança apanhada com a boca na botija.

o microfone
o microfone

Banaliza-se a notícia com fórmulas que se repetem, no teatro medíocre de repórteres cheios de pose e afetação. No palpite gratuito do transeunte orgulhoso de aparecer. Tais esquemas facilitam o trabalho, mas sufocam a informação.

Claro, é a notícia que importa, mas a mim, o que mais pasma é o exagero do tamanho dos microfones de 'externas'... Que símbolo!

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