desenho de Lu Guidorzi
basta um clique! 

berro - a parte inútil da vaca
Publicação esporádica destinada a perder-se como berro de vaca que, todavia muge, apesar da inutilidade declarada de seu berro.

Velhas histórias

17/07/02

Empolgado com as delícias da jardinagem, Jeová plantou bem no meio do Paraíso uma árvore preciosa, cujos frutos suculentos encerravam em seu sumo o conhecimento do Bem e do Mal. O resto da história é por demais velho e sabido para que aqui se repita.

Furioso, ao ver seus frutos roubados e diante da atitude adolescente de Eva, bramiu: "Multiplicarei os teus trabalhos e, especialmente, os de teus partos. Darás à luz com dor os filhos e estarás sob o poder do marido e ele te dominará"¹.

E por mais de 40 séculos a Mulher aceitou submissa o estigma da dor e o cetro de seu senhor e marido. De repente, no crepúsculo de um século iconoclasta, uma parte do elenco pára, se entreolha e resolve questionar seu papel.

O fruto proibido, por fim, começa a germinar. A árvore da razão acabou por tornar óbvia, irritantemente óbvia, uma pergunta banal: porquê, em quê e como a mulher é diferente do homem?²

Esta deve ter sido a primeira pergunta que passou pela cabeça de Eva enquanto mastigava, distraída, a fruta fatal e seus olhos se sentiam irresistivelmente atraídos pelo pênis flácido - as coisas ainda estavam por começar - e pendurado de Adão.

Absorta, talvez, nas sensações agradáveis que sua curiosidade lhe proporcionava - curiosidade que haveria de se tornar proverbial - não atentou, a Mulher, à questão fundamental, racional, masculina que aquela pergunta encerrava. Fosse outra a mulher, de outro tempo, não perderia a oportunidade de propor, dengosa, a um Adão atordoado pela brusca transformação ou embevecido na contemplação de graciosas formas, que se estabelecessem ali, de imediato, regras para o novo jogo. Que se dividissem logo responsabilidades, vantagens e desvantagens, encargos e usufrutos entre o Homem e a Mulher.

Enfim, um dia a Mulher despertou e detestou seu papel, bateu pé e proclamou: Chega! Assim, não brinco mais! Pobre Macunaíma, gostava tanto de brincar...

[continua]

1. Moisés, Gênesis, 3-16   volta

2. Confesso que jamais me sinto seguro quanto às variações do que e porque na língua portuguesa. Há sutilezas além de minha compreensão. Como sempre, não sei se acertei.   volta

|home| |índice das crônicas| |mail| |anterior|

2452473.404