autor, circa 1996 Crônica do dia

Véspera

12/04/07

Nesta manhã tranqüila que antecede a sexta-feira treze, maio se anuncia em luz. O sol mais baixo nos céus do sul, o ar menos sujo na cidade gigante proporcionam um momento raro que se repetirá por algumas semanas, na época do ano de luminosidade mais privilegiada.

Enquanto isto, milhões de maridos traem esposas e outro tanto de mulheres são infiéis a seus companheiros. Políticos e advogados tramam. Líderes e famosos se corrompem. Fanáticos matam e morrem. Desesperados seguem promessas de usurpadores e charlatões. Pedestres vêem o chão se abrir e são tragados. Famintos caem impotentes e atônitos. Trens se cruzam à beira do acidente. Aviões correm por estradas invisíveis. Coveiros fecham sepulturas. Repete-se o 'até que a morte os separe'.

Outonal, a manhã é quente no sol e fria na sombra e, do lado de cá do fim do mundo, silenciosa, até os cães calaram. Uma brisa lembra que o inverno é inevitável e os profetas de catástrofes vaticinam hecatombes globais, como previram a terceira guerra mundial, o fim do petróleo para o ano dois mil e tanta coisa que se esqueceu no caudal da vida.

Como a aranha, prisioneira também de sua teia, que precisa refazer a cada manhã, a sociedade tece e remenda seu emaranhado e nele se perde. O Homem, que voa à jato, teme escapar da armadilha que teceu e se enxergar inteiro e vítima de sua obra maravilhosa, aguarda e espera que lhe caiam moscas...

Como senhora de todas as coisas a humanidade segue e continua a crescer, mas a Natureza, como sempre, restabelece o equilíbrio, de um jeito ou de outro. Afinal, é apenas mais uma manhã, um dia como outro qualquer. Logo o sol chegará ao poente, quem sabe para se pôr em um show contundente a tingir de cores os céus, depois mergulhar em noite de lua minguante, até sexta-feira, dia treze, o que ocupará falas e mentes...

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