retrato de uma carteira funcional de 1986
Policarpo e Alceste
14/03/19
Como Alceste continuasse muda e com cara de espanto, Policarpo estendeu seu discurso no embalo daquele momento a lhe parecer clarividente.
— Percebe? — perguntou com certa ansiedade — se um animal dispõe de superabundância de alimento e come além da saciedade e em consequência engorda além da obesidade mórbida, decreta a própria morte, pelos efeitos colaterais à obesidade, não é mesmo? Esta a beleza do projeto da Natureza: o conjunto de todos os semelhantes daquele indivíduo não se verá ameaçado por muito tempo devido a um sugador inveterado de comida. Alceste respirou profundamente e sorriu. Parecia começar a concordar com as lucubrações do companheiro, que esmiuçou: — Já no organismo social não existe essa salutar morbidade pelo acúmulo de bens e dinheiro (a mesma coisa, é óbvio, pois um se converte no outro). Como poderia a estrutura das sociedades humanas estabelecer um controle automático do enriquecimento individual e excessivo, similar ao existente nos processos naturais? That is the question! Um incômodo silêncio se fez. Alceste olhava com ternura para Policarpo. Este, como que exaurido por um esforço excessivo contemplava a companheira com um olhar distante, como quem olha e não vê. Perdia-se ainda na própria enxurrada de palavras em torvelinho. Quem rompeu o silêncio, que já começava a incomodar, foi ela: "a mim parece que o organismo social, durante milênios, aprendeu a sobreviver, mesmo com artérias entupidas, a respiração entrecortada, o coração aos solavancos, o fígado dilatado e pondo os bofes pela boca." Policarpo arregalou os olhos fixos na companheira. Ela prosseguiu: "Por causa disto, os malefícios decorrentes do excesso de riqueza, de um de seus membros, é incapaz de exterminá-lo sob o peso de suas posses, como um indivíduo fina-se pelo acúmulo de gordura." |
Fri, 15 Mar 2019 09:46:06 -0300 Oi, Clôde Oi, Ana. Fri, 15 Mar 2019 11:55:06 -0700 (PDT) q desenho maravilhoso! sem assinatura Eu também adoro essa ilustração. Se não me engano foi feita para o Jornal da Tarde. Sandrinha é fera. Fri, 15 Mar 2019 15:56:11 -0300 Ai ai ai... Tenho mesmo que aprender muita coisa com sua infinita cultura... Cada vez que leio um texto seu me sinto menos que uma formiguinha miúda... sem assinatura Como diz o provérbio, cada macaco no seu galho... |
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