Animal! - gritou para o motorista do outro carro e, ali, verdade virava ofensa.
Desde as primeiras lições nos informam de nossa condição de bicho, da verdade banal de sermos animais como macacos, ratos e milhões de outras espécies mas, logo, explicitam - animal racional, o homem é um animal racional.
Será? - me dizia, hoje pela manhã, um homenzinho em meu ombro esquerdo: será? E tanto bastou para fluírem mil razões a pintar um homem animal emocional como timoneiro da nave conduzida há milênios humanidade afora.
Outra sociedade, mais razoável, emergiria de um animal emocional - a razão resolve problemas, equaciona os desafios, soluciona impasses. Quem explode, agride e se descontrola é a emoção. O animal racional constrói, organiza, classifica, hierarquiza. É o animal emocional que chuta o balde, o pau da barraca e, muitas vezes, quem estiver por perto.
Em cada esquina se vende emoção em todo tipo de embalagem, emoções baratas ou caríssimas. A indústria cinematográfica é, em verdade, uma fabulosa fábrica de estimulantes da emoção. O cancioneiro popular de qualquer país parece lidar com tema único, o amor - a emoção fortíssima e fundamental para cada indivíduo, ligada à existência da próxima geração. (Ao adquirir tantos significados, amor acabou quase sem nenhum, mas as letras das canções esclarecem de pronto do que falo).
Oscilava, assim, entre arrazoados e sensações, quando no outro ombro a mulherzinha ponderou se não seria mais sensato e melhor para o coração - onde a sede da emoção? - ver no homem um animal tão racional quanto emocional. Já lhe ia acedendo com um gesto da cabeça quando outro motorista manifestou um súbito transbordamento de testosterona com manobras arriscadas e barulhentas, seguida uma explosão de palavras feias demais para se publicar.
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