E agora, aonde foi aquela moça do sonho, agora que acordei? Não me digam que não existia, pois há pouco lhe perguntava se já almoçara, com a manifesta intenção de a convidar, caso a resposta fosse negativa. Cheguei a imaginar um convite para jantar, se ela se dissesse almoçada, mas fiquei sem resposta, acordei. Onde se esconde agora a moça alta - conferi, era um pouco mais alta que eu - dizia, a moça alta do sonho meu? Foi breve o sonho e, por isto, imperfeito, impreciso, já que se constroem os sonhos passo a passo, à medida que os sonha o sonhador. Se não me engano, ela tinha cabelos escuros... será que notei mesmo os cabelos da moça com quem sonhei? Não eram imprescindíveis ao enredo de sonho que mal começou. Pode ser que só agora, desperto, os tenha pintado a meu bel prazer. Não posso nem mesmo garantir onde estávamos: um ambiente público, com outras pessoas impossíveis de descrever. Talvez um grande escritório, um shopping center, talvez? Pouco importa, é a parte escondida do sonhador que lança à tela o sonho em pinceladas largas e generosas ou minuciosas e pontilhistas. Do que lembro do sonho, ela usava uma espécie de uniforme, uma saia escura e justa, blusa branca, solta e de gola ampla. Impossível voltar ao sonho para conferir! O dia logo se impõe cheio de arrazoados e pretensas necessidades, exceto aquelas realmente necessárias, como um copo de água neste clima seco. Nele, se diluem, enfim, os incertos contornos oníricos. Apaga-se a lógica com que a razão tentou tecer uma roupagem para as verdades ocultas nas emoções. Estas, lembranças de sensações e emoções serão as últimas a se dissiparem entre as imagens do "manto de sonhos perdidos" imaginado por Buñuel. Agora, sob o sol forte deste dia frio, me pergunto para aonde foi a moça bonita e sem nome do sonho que se apagou? |
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