Os bondes que desfilavam com garbo pelas ruas do Rio de Janeiro, no final da década de cinqüenta, tinham um sino, um não, dois: aquele acionado pelos passageiros para solicitar a parada no próximo ponto e outro sob o assoalho, acionado pelo motorneiro com o pé à guisa de buzina. Talvez não se tratasse, literalmente de um sino e fosse mais correto chamá-los de campainhas. De todo modo, o som era muito mais agradável que o de buzinas, mas não vim falar de sonoridades. Lembrei-me do sino do bonde devido a um erro, da infância, a percutir ainda em uma cabeça desgarrada. Por muito tempo ouvia na cantiga de roda "dizei senhora viúva, com quem quereis se casar, se é com o sino do bonde..." em vez do filho do conde e nunca me pareceu absurdo tal casamento. Em verdade, era pequeno o suficiente para não compreender, de fato, o significado de viuvez, ainda que vivesse com uma avó viúva. Seria uma questão de escolha: o sino do bonde ou o tal general. Hoje, recomendaria o primeiro, sem vacilar. Mas também não ia falar dessas reminiscências. A cantiga de roda decorreu de outra, a da Terezinha de Jesus - havia um disco de 78 rotações com cantigas de roda, tocado numa vitrola com agulhas de curta duração - Terezinha de Jesus, para a criança, propriedade declarada de Cristo. Ela e seus três pretendentes me ocorreram quando, ao abrir a caixa do correio, deparei-me com tantas vozes prontas a me acudir e a negar o embuste de ontem. Gentilezas e ponderações que, por um momento, fizeram de mim verdadeiro 'Terezinho', diante de tão gentis senhoras, ou senhoritas, que acudiram com, em vez do chapéu na mão, doces falas e sábias lições do fundo do coração. Suas cartas me evocaram a cantiga de roda e desta passei à outra e do casamento impossível da viúva, aos bondes, sucessores de cavalos e burros e outras bestas em vez de motores... |
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