Crônica do dia
Publicação esporádica, a perder-se como berro de vaca, que todavia muge, apesar da inutilidade declarada de seu berro.

 

Apenas 100 anos

05/09/17

Tento imaginar o Maranhão de um século atrás. Busco fatos na História, mas persistem imprecisas as imagens de 1917. Em outubro, na remota São Petersburgo, Lênin e Trótski encetavam uma revolução capaz de muito influenciar o futuro mas, provavelmente, ninguém cuidava disto naquele remoto Maranhão.

No mesmo ano, os Estados Unidos entraram na Primeira Guerra Mundial. Sementes do século XXI, todavia, eram lançadas na América do Sul: a IBM abria sua primeira filial, no Brasil. Meses antes, em Portugal, três crianças afirmavam ter visto "Nossa Senhora", em Fátima, cena caricaturada, décadas depois, no filme La Dolce Vita, de Federico Fellini.

cena de La Dolce Vita
cena de La Dolce Vita

Apesar da abundância de informação, o Maranhão de 1917 me continua nebuloso. Foi onde meu pai nasceu, nove anos antes, fronteira de uma Amazônia quase desabitada e longe do futuro "primeiro mundo", onde se incluía a Alemanha, pátria de um Hitler, então com 28 anos. Ano também do nascimento de John F. Kennedy e Jânio da Silva Quadros mas, apesar da abundância de dados, não consigo imaginar e tudo me parece próximo e distante.

Meu pai costumava fugir da escola naqueles tempos, mas qualquer imagem daquelas paragens equatoriais escapam a meu devaneio, apesar de umas pinceladas recobradas aqui e acolá do que ouvi, de histórias imprecisas do passado. Note-se: distante apenas uma geração, a história se dilui na avalanche de fatos e inovações, na roda-viva de cogumelos da imolação final ou alucinógenos, no atropelamento de maravilhas tecnológicas ou de "milagres" medicinais.

Impossível imaginar uma São Luiz onde um tio teria sido levado às pressas, de charrete, até a igreja de São José de Ribamar, em uma tentativa desesperada por um milagre, mas a fé não evitou a morte prematura do recém-nascido. Passados apenas cem anos, evaporou-se aquele Maranhão.

Tue, 5 Sep 2017 13:21:44 -0300

Muito bom!

Obrigado!

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Como dizia amiúde meu pai, obrigado fico eu.

Valeu!


Tue, 5 Sep 2017 14:26:10 -0700 (PDT)

nossa! preciso rapidamente ouvir todas as historias q vc conhece do Maranhao, como irrmao mais velho, sabe muito mais
nao sabia q papai costumava fugir da escola, imagina!! ele q caia de pau em cima de vc e todos nos, com qq coisa a ver com "escola"
nao sabia da corrida de charrete em busca de um milagre ... esse tio era mais velho q ele?

bjs

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"Rapidamente" como previsão de meu desaparecimento iminente?
São memórias imprecisas... papai não gostava de falar desse passado.
O primogênito de vovó Maria morreu ainda bebê.


Tue, 5 Sep 2017 22:32:15 -0400 (EDT)

Clode,
Não sei direito o que você estava pensando quando escreveu essa crônica, mas na casa da minha mãe encontrei muitas fotos e também uns negativos de vidro que me encantaram. Não sabia o que fazer com aquilo, falei com o Alexandre e ele conseguiu os positivos. Mando em anexo. Uma foto é dos nossos avós, possivelmente dentro daquela casa na travessa do comércio onde moravam; a outra, mais interessante, é no interior, uma casa da roça, uma família grande, com nossos avós no centro da foto. Não é S Luiz, nem tem 100 anos, nem sei que família seria essa, mas mando assim mesmo.
Beijos
Lucia


Que maravilha, Lucia!
Muito obrigado. Por que você diz que não tem cem anos? Como sabe? Vovô e vovó têm crianças no colo... seriam filhos? Você acha que eles já estariam mais velhos na ocasião? Não se esqueça que vovô nasceu em 1870: em 1917 teria, portanto, 47 anos (a exata idade do Vicente hoje, que nasceu cem anos depois). Estas fotografias são uma preciosidade. De novo, muito obrigado!


Wed, 6 Sep 2017 06:07:04 -0300

Amigo,

Depreendo da sua cronica a importância decisiva do genoma no destino do indivíduo. A herança do Prof Jorge floresceria em qualquer espaço e em qualquer tempo, e seu raciocínio lógico-matemático certamente encontraria expressão a revelia das circunstâncias. A vinda para o Rio apenas facilitou para que ele se tornasse o mestre das matemáticas que foi, Nossas idéias - como sempre, correndo em paralelo.
Ainda estou finalizando um trabalho de 3 meses aqui em Londrina, morrendo de saudade das netas e dos filhos (a Rita veio 3 vezes). Saudades também de conversar ao vivo com o Amigo, Na dificuldade, louvemos a internet!

Grande abraço


Ebert

Nossa! Três meses longe de casa não é brincadeira!
Obrigado. Sua observação me lembrou outra "epopéia", a vinda para o Rio. Desde sua motivação: uma fotografia de um lindo canal ladeado por palmeiras imperiais - era o Canal do Mangue! Até o "bota-fora" eternizado em um bico-de-pena de um colega - desenho que se perdeu - onde a legenda dizia "bota-fora do (desenho de uma cruz seguido do de um bule) até a viagem de Ita...
Saudades também, vamos combinar para conversar e comemorar.
Viva a internet!


Thu, 07 Sep 2017 05:30:13 -0300

Minha familia tem uma parte no maranhao tb

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Esses árabes espalharam suas sementes mais do que podemos imaginar...


Mon, 11 Sep 2017 19:35:21 -0300

Que bela bela lembrança, mais uma vez,
Mermão. Mas... Mas... O que me aperta de verdade é a lembrança de um filme de um certo Federico Feline, chamado... "Lá Dolce Vita"...
Jamais esquecer...

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Somos ambos apaixonados por Fellini.
Belo filme. Bela trilha...
Tive o disco, emprestado pelo "Serginho", filho do Sérgio Bernardes, lembra?
Sim, inesquecível.

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