autorretrato 

Aprendizado

26/04/17

Antes da existência de qualquer coisa, antes de se fazerem os céus e a Terra - e todos sabem a quantidade absurda de estrelas a povoar os céus, sem mencionar outros planetas, cometas, galáxias e as massas incomensuráveis devoradoras de luz chamadas de buracos negros, bem como a lista infindável de bichos, plantas, pedras e líquens e fungos e micro-organismos a povoarem a Terra e mais todas as criaturas incríveis dos sete mares e de todos os oceanos - antes de tudo isto só existia o Verbo, isto é, a palavra de Deus a falar uma língua universal, passível de ser entendida por todos e tudo que Ele logo começou a fabricar, através de ordens verbalizadas: "Faça-se", e a coisa passava a existir como se sempre existisse, o céu por cima, a terra por baixo e os mares a sacudirem suas brancas ondas sobre praias e falésias. Cumprindo assim a mais deleitável de todas as tarefas, produzir universos e paraísos com fontes murmurantes de água cristalina e flores muito coloridas e perfumadas e borboletas esvoaçantes e sorrateiras serpentes.

Após cada etapa, o Verbo media seus feitos e os aprovava, antes de passar ao próximo "Faça-se" para produzir uma nova espécie, consoante os desígnios do Verbo, sem qualquer tipo de auxiliar e sempre de muita ação, absolutamente intransitivo e onipotente, onisciente, onipresente, onilíngue e onividente. Satisfeito, então, com o Paraíso e suas árvores cheias de frutos quase voluptuosos, bem como com os guizos do rabo da serpente a chacoalhar em seu rastejar sinuoso, pôs-se o Criador a esculpir o Homem, detalhe por detalhe, ainda carente de umbigo, a lhe dividir na razão áurea a altura e, também dos mamilos. Era um Adão liso, com ventre e tórax desprovidos de adornos, mas guarnecidos de pelos aqui e acolá. O Verbo silenciou com um profundo suspiro... Aprendera. Faria agora a Mulher.

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