Bilhões

19/08/99

 

Olá corretor! Tudo bem? Como vai o futuro? Qual a sua cotação? Não, não a sua, corretor, a do futuro, é claro. Que futuro? Ora, o seu, o meu, o de todos nós. O futuro da humanidade e, se você fizer questão, o dos outros bichos e plantas também. O futuro da vida, digamos, mas pode pôr as pedras, o ar, a água e todos esses bens inanimados, para falarmos de um futuro maior, o do planeta. Não é deste que se apregoam as cotações na Bolsa de Mercadorias e Futuro? Ah, dona Sabrina, não era. A bolsa de valores não parece capaz de lidar com o inegociável, com o imprevisível, com o imponderável! Lida com bilhões, outro tipo de mercadoria.

Os bilhões parecem agradar aos repórteres do rádio e da tevê. É preciso ouvir como esses bilhões lhes enchem a boca. Sabe, dona Sabrina, noticiário econômico tem mais bilhão que vírgula pontuando notícias com a altivez de deuses. Bilhão pra cá, bilhão pra lá e cada um parece uma pequena explosão.

Vou ao banheiro e, diante do espelho, tento os bilhões: bilhões! Nada, nenhum barato, nenhum frisson nenhuma sensação especial, nenhum arrepio - nada! Insisto. Bochecho as letras na boca e busco toda a empáfia de que sou capaz: bilhões! Espero alguns segundos... nada!

Poderia ser a falta de números. Teimo ainda: oito bilhões, 40 bilhões, cem bilhões mas as tentativas se mostram inúteis. Ah, a unidade, talvez, experimento a receita completa: cem bilhões de dólares!... ainda assim, nenhum estremecimento. Nada. Cuspo na pia, lavo a boca e o rosto na água fria. Acendo o cigarro que me apregoa o futuro. A cada um, sua droga.

Definitivamente, minha cotação é nula na bolsa de lantejoulas.

 

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