Se a mim coubesse regular o termostato do clima, sem dúvida escolheria dias como estes três - hoje, ontem e anteontem - à guisa de padrão para o lado de cá do fim do mundo. Em verdade, tenho medo até de falar, o inevitável medo da felicidade que, o doutor Flávio Gikovate explica, nos invade sempre que tudo vai bem, quando estamos em lua-de-mel com a pessoa amada, quando temos o suficiente para o sustento e sobra um pouco etc. Aí, diz ele, sobrevém o pânico, um grande temor nos invade e corrói de que aquele paraíso acabe. Por isto, tenho medo de dizer o quanto gosto do calor. Ah, dias maravilhosos e noites também. Ontem havia meia Lua no céu, que não estava límpido, cristalino, condição típica das noites frias, de geadas e coisas piores. Por isso o luar era baço, fosco, dir-se-ia, a evocar a luz misteriosa do luar dos eclipses. A verdade é que me sinto bem nestes dias longos e quentes. Como índio de Pindorama recebo em toda pele o calor e as lufadas de vento quente que, ainda assim, refrescam. Alguns atribuem o poder e a grana do Norte ao frio e apontam o calor para justificar a miséria africana e a nossa, sul-americana. Estou fadado, pois, ao subdesenvolvimento e à miséria. Como Macunaíma olho quanto papel em branco me sobra ainda e exclamo - Que preguiça! Onde o coco com minha água? Sim, o verão induz sonhos que o inverno veda sonhar. Devaneiem, pois logo será Carnaval e ao passar o último bloco os ventos já varrerão folhas secas junto com os confetes em prenúncio do outono, sem pá, sem apelo por que desde sempre "les feuilles mortes se ramassent a la pelle" e os últimos bafejos de verão soprarão as cinzas da quarta-feira para que todos lembrem que nosso verão poderia ser um pouquinho maior, durar um tantinho mais... Aproveite, que em dias assim não vale à pena ler bobagens de verão... "as folhas mortas se recolhem com a pá" - da canção "Folhas Mortas" |
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