Na tela preta, meu rosto se sustenta na mão esquerda. Atrás de minha cabeça é possível ler em letras brancas e invertido pela reflexão: enfoco. Reflexo também de outro tempo, meu e de um mundo cheio de fantasias de um futuro diferente de hoje. Ao se acender o monitor, nova realidade se impõe e apaga a outra, destilada de quem não é e cogita. A virtual tem a virtude primeira: ser e me mostra a Antipática.
Ela me pareceu antipática ao primeiro olhar, com seu rosto decepado pelo cachecol e sua pose arrogante. A mão que finge segurar a alça da bolsa resume a afetação. A boca entreaberta, como se esperasse o batom secar, enfatiza a falta de um quê humano em sua perfeição de boneca na vitrine.
E era isso que era, um anúncio de moda numa página de jornal, ou melhor, em sua página virtual na internet. Apesar de tudo isto, me atraiu e salvei a imagem fortuita, datada pelo texto: outono para eles, aqui, primavera do ano de 2005.
Anúncio copiado do New York Times
Como tantas outras, foi parar numa galeria de temas para o desktop, já que mudo com freqüência o fundo de tela. Era uma foto onde a cor se resumia à pele, pois os cabelos puxados para trás, eram como se não existissem. O batom suave mal mudava o tom natural dos lábios. Afora isto, era como se a imagem fosse em preto e branco, com refinada gradação de cinzas a variar tanto no claro-escuro como em tonalidades mais quentes ou mais frias. Acredito ter sido esta refinada gradação o que me encantou.
Escolhi, então, um fundo cinza, com ligeiro predomínio de azul, para a imagem e de vez em quando ela voltava ao desktop. Outro dia, quando ela veio, talvez por influência do preto intenso do vestido, mudei a cor do fundo - passe-partout da foto! - para o preto e... se fez a luz!
Transformação tão radical levou-me a este relato de uma banalidade com que não se deve perder tempo. Em resumo, modelo antipática, fotografia simpática.
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