Onde está teu deus? Põe-no por terra sem vacilar. Destrói seus pés, de barro ou aço, demole sua coluna e não te deixes seduzir pelo reluzir de ouros e pedras. Onde teu deus? Lá estará tua fraqueza. Eis onde sucumbirás a ti. Erigimos em divindade nosso calcanhar de Aquiles, pois ele é capaz de nos derrubar. Que elegestes em divindade? A glória, o holofote, as vozes retumbantes do palco, o delírio do aplauso, a embriaguez da fama? Ou, porventura, a amada idílica, o humano feito deus, eternamente desejado e impossível de possuir? Não importa, cumpre demoli-lo pedra por pedra, derrubar seu templo tijolo por tijolo - chega de metáfora!
Nosso maior desafio se esconde no que nos é mais caro. Dorme em nosso mais precioso tesouro, aquele do qual nem gostamos de falar. Absurdo? É possível. Sempre fui péssimo psicólogo de botequim. Sobrevivi de lampejos de intuição, clarões que, de vez em quando, me permitiram vislumbrar um caminho que não sei se é meu. Clarão como este, que me despertou com a pergunta nítida "onde, teu deus?", e a súbita sensação de que a história do bezerro de ouro fora mal entendida por milênios, de que ele mora em nós, de que construímos e pintamos de dourado nossos bezerros, em nós. Quando quis compreender e me deixar afundar, o clarão se fora - a compreensão súbita, o insight, é como o flash, dura o tempo do relâmpago, a pintar a paisagem no milésimo de segundo, ou menos. Sobrou-me a imagem bíblica como metáfora e a pergunta aguda: onde está teu deus? Passada a magia do momento de esclarecimento, seria absurdo me dizer (e a outrem soaria arrogante): cumpre destruir os pés de barro de teu deus, por mais que o brilho de seu ouro te possa reluzir e seduzir e se não sabes onde achar teu bezerro de ouro, olha naquilo que te é mais caro. No entanto, apenas esta certeza nebulosa me sobrou... |
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