Como se fosse verão

23/07/03

Uma grande mosca pousa entre a pele e a sola do pé. Escolheu, também, o limite entre sombra e luz, mas o que surpreende é sua presença um mês depois do solstício de inverno, em época de frio sem moscas domésticas. Mas o calor tem subido rápido no final das manhãs com tardes quentes e secas, de ar sujo.

Há muitas flores e muita poeira. Falta chuva. Juízes aguardam sentença! Deputadas e deputados, senadoras e senadores, cozinham o veredicto na briga pelos melhores bocados do grande queijo. Por trinta dinheirões a delação e os aplausos aos bravos soldados que com tanques, helicópteros e mísseis mataram quatro encurralados. Medalhas, medalhas!

Caiu-me nas mãos história antiga, da Grécia clássica. Protágoras, sofista que viveu entre 485 e 410 antes de Cristo, foi contatado por Euatlus, que queria ser advogado, para lhe ensinar retórica. Recebeu metade e o resto, seria pago quando Euatlus ganhasse sua primeira causa.

Acabou o curso, o tempo corria e nada de Euatlus advogar, até que Protágoras, decidiu processá-lo. No tribunal, argumentou:

Euatlus diz que não deve me pagar, o que é absurdo, pois se ele ganhar esta causa, sua estréia nos tribunais, deverá me pagar por ter vencido sua primeira causa. Por outro lado, se perder, terá de pagar-me do mesmo jeito, por força da sentença desta corte. Assim, se perder ou ganhar, deverá me pagar.

Euatlus, bom aluno, expôs seu contra-argumento:

Protágoras diz que devo lhe pagar, mas isto é que é absurdo, se ele ganhar, terei perdido minha primeira causa e, como combinado, não será preciso pagar. Já, se ele perder, terá de me pagar por sentença desta corte. Assim, se perder ou ganhar, deverá me pagar.

Há muitos insetos, como se fosse verão. Sempre se pode explicar qualquer coisa com argumentos lógicos. E o contrário dela, também.

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