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Credo28/09/01 Menino fui obrigado a decorar um credo que não podia compreender e, muito menos, saber o que credo poderia significar. Assim se ensinavam as orações - repetir palavras como gravador. Repetíamos aquelas e outras, com os efeitos entorpecentes do repetir rezas, mantras ou canções. Um texto de José Saramago, sobre Deus e o que ele chamou de "fator Deus", trouxe amigas e amigos a perguntar qual a minha opinião. Opiniões pouco importam. Se conseguir, digo no que não acredito, um credo negativo pois, não sendo ateu e tampouco crente em determinado Deus, só assim consigo abordar o assunto. Não acredito no velho Jeová da caricatura primorosa de Guerra Junqueira nem nos incontáveis e lascivos deuses do Olimpo ou nesses lugares incertos, moradas de deuses que jamais podemos visitar. Não acredito nos deuses bichos nem nos cataclísmicos e muito menos nos deuses das religiões constituídas, que esmiuçam em leis e sanções o certo e o errado e patrulham as miudezas com o fardo da culpa. Não acredito que a vida se limite à mecânica biológica, que a razão percebe e explica - não só a vida do Homem, mas a do cão, da girafa, do mosquito, da lombriga, dos cogumelos, palmeiras - toda a vida. Não acredito que a beleza exista apenas como produto da vaidade humana e que a borboleta, o canário, o elefante não se deleitem também com o que lhes parece belo. Não acredito que esses mistérios possam se explicar pela razão. Não acredito na importância do indivíduo, nem na idéia de permanecer o mesmo, com todas as mazelas e imperfeições, para sempre, através da alma, dos céus, dos infernos ou de uma corrente de reencarnações. Volta a imagem de uma única folha da floresta amazônica a sonhar com a vida eterna. Durar para sempre, estação após estação, talvez entre as páginas de um livro, mas fora do ciclo de vida e morte que é a Floresta. |
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