Do ócio
30/01/17
O sonho do ócio perene e isento de culpa perambula nas fantasias da humanidade, mas, na prática, o ócio assusta. Embora dito doce por italianos e almejado por muitos, o "nada a fazer" apavora a mente. Ela logo procura algo para se manter ocupada, para a entreter e evitar o "vazio" (muito buscado na meditação!). Finda uma tarefa e passado o relaxamento inicial, o cérebro sente a angústia do amargo far niente. A máquina de manipulação de ideias se vê perdida sem um roteiro para seguir, sem uma diretriz a orientá-la e ocupá-la. (Daí brota e floresce a indústria do entretenimento.) O cão roda duas ou três vezes e se deita. A ave se empoleira, seja para observar ou dormir. Até o peixe se aquieta para usufruir o sentir-se vivo e bem. O bicho-homem, não, se inquieta e busca o "controle remoto", o telefone e até um texto qualquer - livro, revista, folhetim para aplacar a mente acostumada ao incessante turbilhão verbal, a infindável manipulação de palavras conhecida como pensar. O vazio possibilitaria o inédito, algo não induzido pelo pensamento publicado e coletivo e esta possibilidade assusta. Corremos em busca de um filme, de uma notícia, de uma conversa fortuita na rede social ou pelo telefone. Hoje, tudo se resume no telefone celular. Pau para toda obra, graças a uma miríade de "aplicativos" capazes de fazer e desfazer. Através da pequenina máquina, pessoas conversam, se envolvem, se veem, reagem à palavras, vivem o fluxo das falas encadeadas do vasto mundo imaterial do pensamento. O predomínio do intelecto, de uma realidade virtual e cheia de coisas apenas imaginadas, de índices e dados estatísticos a medir "fatos" como Bolsa de Valores ou o "preço justo" de um bem se contrapõem à necessidade de alimento, abrigo, à sede e à própria vida. A rede estendida e a água de coco desafiam "outro coco". |
Mon, 30 Jan 2017 16:51:04 -0200 Oi, Clôde Oi, Ana, |
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