Os fatos da atual campanha política brasileira me evocaram o refrão de uma brincadeira de criança, brincadeira que sou incapaz de lembrar, mas cujo estribilho ecoa ainda em mim sem explicação: "tudo que seu mestre mandar, faremos todos", repetiamos em coro, crianças. Talvez não fosse "seu mestre", poderia ser "seu lobo" ou outra coisa qualquer, registrada há cerca de sessenta anos nestes neurônios.
"Tudo que seu mestre mandar, faremos todos"! Em verdade, não se restringe aos rumos das atuais eleições a evocação do estribilho de uma infância longínqua. Volta e meia me pergunto por que tantos têm tão premente necessidade de um guia, buscam até, hoje em dia, um personal isso, um personal aquilo, anseiam pelo guru, pelo especialista pronto a dizer o que fazer, o que pensar. Uma amiga comenta de vez em quando: é, pensar dá trabalho...
Deitado eternamente em larga rede, coco na mão, canudinho na boca faremos tudo como quer seu lobo, como seu mestre mandar. É para votar nesse e naquele, não? Faremos todos. Precisamos eleger fulano, derrotar beltrano? Faremos todos. E "seu mestre" se esbalda e catequiza e dá ordens disfarçadas de sugestão.
Era brincadeira de brincar no meio da rua quase sem carro, então. Teria alguém inventado a brincadeira com segundas intenções? Terceiras, quartas... as piores intenções? Defenderiam-na alegando a tal voz de Deus a repetir ser desde pequeno melhor torcer o pepino? Sonhariam crianças obedientes, comportadas, perfiladas e sem ousar, inovar, inventar, avessas à originalidade? Carneirinhos amestrados pelo bastão e voz do pastor? Tudo que seu mestre mandar todos farão, sem pestanejar, que assim é mais fácil, não precisa pensar.
Crianças, é claro, o refrão nos parecia natural como tudo. Não lembro do brincar, mas brincávamos sem brincar de filosofar.
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