Crônica do dia |
Ao soberano primeiro bastou o gozo da vaidade inerente ao líder. O segundo quis quinhão maior e cobrou fatia de todo fruto de obra de súdito. O terceiro declarou dever o imposto por seu antecessor e alargou a fatia e o quarto veio e impôs um tanto a mais a inaugurar uma tradição tributária. O quinto quis pôr água fria na ebulição do mundaréu e estreou promessas: abrirei picadas mais largas, trarei águas mais puras e prometeu mundos e fundos, imundos. Já o sexto imperador exigiu sinais de submissão: que se curvem todos à passagem do rei e da rainha, salvo se esta vier de minissaia muito mini e, como prosperasse a família real, pois no ócio peculiar às divindades e reis resta por distração a procriação, a cumprir a instrução primeira de crescer e se multiplicar, brincaram imperatrizes e imperadores de inventar ducados e ministérios, condados, belas condessas e duques sedutores e perguntavam a seus espelhos da existência de outro soberano mais poderoso ou outra soberana mais bela. Quando prosperaram uivos e rosnares inconformados, subversivos, vozes ameaçadoras a apontar o que queriam esconder, cooptaram meia multidão e lhes deram armas e slogans e garboso quepe com a insígnia real e a polícia combateu o inimigo, há pouco, irmãos. Prestidigitadores cheios de truques lançaram desafios como enxames sobre cabeças caladas sob a lã ou o solidéu. Bandeiras e hinos clamaram à segregação e se riscou no chão imaginário fronteiras de incompreensão e Eva conheceu sua nudez e a de Adão e um homem branco achou negro seu irmão e a mágica do charlatão levantou o morto que se escafedeu na ladainha dos urubus: "doutor João ratão morreu na panela de feijão..." com a macacada a abanar o rabo em vez do fogo para imitar o sorriso do cão. Ao fundo, uma voz alteou: rato ou porco, tanto faz, sirva-se a feijoada! |
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