Fins e afins

23/02/10

Terminou o carnaval. Acabou o horário de verão. Chegou ao fim o signo de Aquário, crença milenar a assinalar em um céu virtual, e não no de nossas noites estreladas, agora com Órion, o gigante com cinturão de Três Marias, soberano no apogeu. Acabou-se o domingo ensolarado com resquícios de seu esplendor nos reflexos rosados e alaranjados em poucas nuvens dispersas em vasto vestígio de azul, realçado por aquelas tonalidades nos cúmulos passageiros.

Assim como para o carnaval, o verão, o signo astrológico e o domingo, há fins a toda hora, para tudo, todo tipo de fim. É preciso o término para permitir o novo. Num futuro imaginado haveria, enfim, o fim dos fins... ou não? É concebível o término de todo final? De volta ao nada inicial? Um retorno ao vácuo de toda matéria? À inexistência primordial, ausência absoluta de qualquer átomo ou mesmo um único píon? Apenas o nada inaugural de onde um deus ou uma explosão tirou tudo, inclusive você e eu e toda maravilha ao redor, como, da cartola, um mágico tira coelhos, lenços e elefantes? Alcança a razão tal suposição?

desenho de Luciana Guidorzi
desenho de Luciana Guidorzi

Logo, fevereiro acabará e a vida continuará bela e viva a se alimentar de cada fato, de cada ser, de todo o inédito, do instante único que cada momento é. Ontem, ao anoitecer, uma cigarra começou sua cantoria muito perto. De tão exagerada tornou quase impossível conversar e, no escurecer se rasgou uma faixa de luz alaranjada, intensa o bastante para se refletir como brilho na terra batida e poeirenta do chão. A tempestade passageira chegou mansa, trovejou, relampejou, pingou um pouco e passou. A noite se fez preta.

Amanhã o dia será mais curto que hoje e a cada dia se perderá mais um tiquinho de luz, até o solstício de junho, com a noite mais longa do ano. As árvores já se despem para a ocasião a tecer tapetes de folhas no chão.

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