Crônica do dia

Fresta

28/08/06

Você entreabriu uma porta a olhos autistas que não compreenderam o inédito que entrevia vário e infindável através da fresta e, ao convite à dança, à pista, às luzes, aos festejos do salão, que vieram em risos, acenos, olhares ternos ou cheios de promessas, que passaram como vapores passageiros ou em afagos ligeiros ou cheios de volúpia e tanta incompreensão - um abuso ao facho estreito de luz intensa e um nada aos olhos imóveis, parados, autistas e se logo foi, como ocaso, ao acaso de uma canção, no roldão da turba a ferver, no fervor de outro olhar mais simples, mais intenso ou certeiro sem que dedos se tocassem, sem que o cheiro se cheirasse e você era outra e sempre a mesma, tão diferente e tão igual para aquele que, alheio, perpassava o baile, os ritmos, as tramas e eventuais amores incapaz de ler o poema de modinhas, sem ouvir o samba dos tambores até nova fresta em outra porta impotente para ampliar o salão, que manteve estreita e perturbadora a visão do sempre inédito fora, onde o mundo simplesmente girava seu giro de pião e o Homem cumpria seu destino de Abel e de Caim e semeava deuses, à guisa de remediar e divertir e Você, como as músicas, se sucedeu em tantas embora a mesma, sempre e sempre desafio inatingível à compreensão de um eremita de si. Complemento e pedaço de um eu incompleto, antimatéria de mim.

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