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Inveja08/08/03Os oráculos do clima acertaram e os primeiros pingos começaram a cair aos 16 minutos de ontem, do lado de cá do fim do mundo. Folhas grandes, largas e sanfonadas, cujo nome ignoro apesar de as conhecer desde criança, permitem a precisão ao ecoar como tambor. Em verdade, choveu pouco, mal deu para lavar o pó grosso encrostado em tudo, mas ainda assim a natureza se rejubila desde então. Além de folhas e ramos lavados, a festa maior é da passarada. Desde ontem, com penas ainda molhadas, enchem o espaço - do chão às alturas - com vôos, pios e cantos. Chegam de repente de todo lado e todos ao mesmo tempo, com muito barulho. Grandes e pequenos e com tudo que é voz. A jabuticabeira é um atrativo a mais, com poucos frutos a amadurecer fora de tempo, um aqui outro lá. Ontem, o vento soprou mais frio e pensei que, para quem voa, o mais importante é ventar: energia de graça, possibilidade de planar. O vento é fundamental, cogitava, basta olhar a garotada a correr quando quer empinar pipa. Correm, para criar um ventinho. Todavia, hoje o ar está imóvel, nenhuma folha se move e parece haver ainda mais pássaros. Talvez tenham gostado do ar mais limpo, talvez estejam de olho nas gordas minhocas que saem da umidade subterrânea para um banho de... não, não há sol - o dia segue nublado e feio. Uma amiga querida implica com aves, com bicho de pena, diz ela. Muita gente tem medo de galinha e outros se divertem ao assustar visitas com galos garnisé. Pássaros nunca me fascinaram como, por exemplo, insetos. Hoje, no entanto, me pego toda hora de pescoço espichado a acompanhá-las com o olhar. É inveja, claro. Não das aves em si, quase todas com ritos de acasalamento relâmpagos, que mal duram um segundo e torna difícil as invejar, mas de poderem voar. As olho em seus vôos silenciosos certo de que trocaria de lugar, sem vacilar. |
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