Ah, quase todo mundo algum dia se perguntou, apavorado e muito seriamente se, porventura, estaria louco ou à beira da loucura. Vi esta dúvida terrível, em maior e menor grau, de mais perto ou de maior distância ao meu redor e, é óbvio, em minha própria cabeça quando já não podia discernir com clareza até onde o que ali havia era seu, o quanto seria apenas por ser lata-de-lixo de propagandas e pregações, dos restos da volúpia por cada partícula da poeira de tostões, da fome infinita de qualquer migalha que amontoe milhões. Um belo dia, diante do espelho, da amada ou do nada eis que o vazio nos enche com a dúvida insuportável: enlouqueço? E na avenida o carro-chefe da escola-de-samba, obra-prima de mãos anônimas, se materializa em Esfinge de ouros e purpurinas, adornada de mulheres reluzentes e índios em plumas brilhantes, a desafiar como enigma e promessa: decifra-me e devora-me. Sim, pois o velho sonho retorna na canção do mar, do mar que não existe, onde é tudo mentira e pura alucinação, do mar apenas mais um devaneio meu. Não existe mar. Mar da praia que também não existe como não existe areia, nem sal, nem sol, nem céu azul, nem suor, nem algas nem cabelos molhados ou o lixo que o mar devolveu. Não existe peixe morto, nem passaro que cutuca areia molhada, nada. Não existe tarde acaba nem sol que se põe... Tudo é mentira, que some na areia da praia como a espuma, que a onda apaga até tudo virgem, de novo, com tamanha mentira do tamanho do mar. Não, garota, o mar é ilusão, não existe e você, também é ilusão. Não existe você, ilusão. Você? Quem é você? Um nome, um sonho, um ser não ser que flui reflui? Quem?... Você foi um sonho louco de Colombina de quem não foi Pierrô e não foi Arlequim. E a Esfinge sonha um carnaval só de piratas de perna de pau e olho de vidro e cara de mau... |
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