Não deu
22/03/02
Logo hoje! Hoje, que precisava tanto da crônica, ela não sai. Parece de propósito, adrede para me entalar mais e mais. Dois motivos especiais clamam pelas linhas de cada manhã. Por sinal, na manhã fria e de linda luminosidade, aproveitei para assinalar o começo da época do ano de luz mais bonita, mais oblíqua, mais modeladora. Era, também, uma tentativa de crônica, a primeira a falhar.
Depois, ensaiei um lamento por não saber falar de coisas simples, dizer sem volteios o que se passa ao redor e dar notícia do que consigo perceber dentro e fora de mim. Falhava pela segunda vez, sem galos a cantar e, aí, ri. Ao menos isso, manter a capacidade de não se levar muito à sério.
Foi quando encontrei um texto antigo - vejam formosas leitoras e iluminados leitores, digo antigo, como se falasse de algum papiro egípcio, de um texto de 1996! - e imaginei que pudesse me levar a um tema difícil. "Oh governos do mundo industrial, esgotados gigantes de carne e aço, eu venho do ciberespaço, a nova morada da mente" assim começava o texto, hoje célebre, que afirma ao terminar: "Criaremos uma civilização da Mente no ciberespaço. Que ela seja mais humana e justa do que o mundo que seus governos fizeram antes." Desisti do manifesto, escrito por John Perry Barlow, em Davos, Suíça, no dia 8 de fevereiro daquele ano e publicado pela revista Wired.
Como o galo calou pela terceira vez, restou pedir conselho ao cão, ao gato, às aranhas, aos grilos e a toda bicharada, num dia que já tivera céu puríssimo, nuvens escuras com cara de chuva, friozinho, e muito calor. Tudo e todos me confirmaram: inútil insistir, em certos dias, simplesmente não dá.
Ainda fiquei, como idiota, a ver se passaria um pretexto desavisado, para transformá-lo, ainda que na marra, numa crônica. Eu precisava muito de uma, qualquer uma. Tudo em vão. Como vocês acabaram de testemunhar, foi inútil, não deu.
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